sexta-feira, 11 de maio de 2012

Marcas na Bíblia

Lembro-me da vez que demonstrei explicitamente minha chateação para com minha avó Iolanda... Ela, ativa na Legião de Maria, no Apostolado da Oração, nos Grupos de Oração, não perdia uma Missa, bem como estava em todas as celebrações e novenas que aconteciam na Comunidade. Por tantos compromissos na Igreja ela sempre carregava a minha Bíblia, a que ganhei no dia da Crisma. Não tinha uma bola leitura, e a escrita ainda era um pouco pior, mas era disciplinada no que fazia e tinha o hábito de ler a Bíblia todos os dias.
Ao longo do tempo e com tanto uso, esta minha Bíblia foi criando marcas, ou seja, gastando e envelhecendo pelo uso. Um dia me dei conta disso. Achei que a Bíblia deveria permanecer tal como a ganhei, sempre nova e com cheirinho de presente que marcou data. Mero e tolo engano!
Quando disse à minha avó o quanto a Bíblia estava gasta, percebi que ela ficou chateada e disse que me daria uma nova. Respondi que não precisava, pois o meu presente era aquela e não o que possivelmente ela queria me repor. Não dissemos mais nada, e ela continuou a usar.
Um belo dia, meu avô deu-lhe de presente uma Bíblia, tal como a minha. Ainda assim ela me perguntou se eu gostaria de ficar com a nova. Falei que não e que eu continuaria com a mesma.
Hoje, não tenho mais minha avó, aliás, não tenho nenhum dos meus avôs e avós aqui comigo. Todos já têm sua morada junto de Deus... Mas, carrego por todo canto não só a minha Bíblia, mas também a de minha avó. Pra ser sincero, tenho mais quatro Bíblias de marcas e editoras diferentes. Tornei-me muito mais que um colecionador, na verdade um fã de Bíblias. Ainda me faltam duas, as mais caras, que ainda terei para pesquisas e estudos. Faço a minha liturgia diária todas as manhãs antes de ir para o trabalho e sempre que me proponho a estudar de maneira mais concisa e profunda, consulto pelo menos duas delas.
Aprendi nesse tempo de saudade causada pela ausência dos que amo, que não importa as marcas deixadas, por mais que aparentem sujeira, excesso de uso e desgaste material. O que importa é que alguém passou por ali, alguém esteve de posse daquilo e usou da melhor maneira possível. Importa que a sabedoria contida nas prosas daquela que nem teve escolaridade, deixou-me de herança a humildade e a necessidade de buscar sempre a Deus, acima de qualquer coisa.
Têm marcas que valem a pena ter e manter. Marcas em nossa história, com a autoria de pessoas que realmente nos deixaram de herança a sabedoria que dinheiro algum poderia comprar. Cada vez que pego não só a minha Bíblia, tanto usada por minha avó Iolanda, mas a que ela ganhou de meu avô, procuro imaginar quantas verdades ela pode ter lido, entendido, aprendido e vivido durante os anos de sua existência.  Quantas vezes ela se pôs de joelhos pra falar com Deus e ouvi-Lo durante os seus momentos de oração.
Marcas, que tenho o orgulho de contar e repassar ao meu filho de 8 anos. Hoje, ele já têm duas Bíblias, que faço questão de lermos juntos, sempre que o tempo presente nos permite...
Que nossas Bíblias sejam cada vez mais marcadas pelo excesso do uso!...
Ailton Domingues de Oliveira
11/05/12