Das lembranças do tempo de catequese, uma que não sai da memória é a do Padre João. Italiano, seu nome mesmo era Giovanni Murazzo, mais conhecido e reconhecido como João. Suas missas tinham um "q" de especial para a criançada. Eram lotadas sempre. O motivo era que ele fazia com que prestássemos atenção nas leituras e no Evangelho e durante a homília fazia perguntas. Quem respondesse certo ganhava um santinho. Guardei muitos santinhos dessa época.
Isso dava certo. Não sei se hoje, essa mesma pedagogia para fazer com que as crianças e adolescentes sintam-se parte da comunidade e realmente participem da Celebração teria o mesmo êxito.
Seu linguajar, sua forma de anunciar a Palavra atingia a todas as idades. Não havia quem não o conhecesse, fosse por seu carisma, fosse por sua doce e acolhedora forma de saudar, fosse pelas Celebrações e os santinhos, fosse simplesmente pelo nome... Pe. João era sinônimo de alegria, de participação ativa, diálogo...
Numa Missa de quarta feira, as dezenove e trinta horas - Comunidade de Nossa Senhora Aparecida (Vila Cantizani - Piraju - SP) - como de costume, ele chegou com boa antecedência. A Igreja ainda tinha a famosa e saudosa escadaria, que para os padrões de hoje não auxiliava aos portadores de necessidades especiais, muito menos as pessoas de idade que ali frequentavam. Subindo os primeiros degraus um menino entre dez e doze anos veio em sua direção e pediu dinheiro. Ele sentou ali mesmo na escadaria, deixando sua maleta e sua batina de lado e começou a conversar com o garoto. Aos poucos outras crianças foram se juntando. Várias rodas se formaram ao redor do Pe. João para ouvir as mesmas parábolas que Jesus contava. Sua expressão cativante e amorosa trazia as pessoas para perto, principalmente os pequenos. Um verdadeiro Dom Bosco contemporâneo.
Nos encontros da Vivência Cristã de nossa comunidade eu sempre era escolhido para participar de uma certa dramatização protagonizada por ele mesmo. Não lembro o contexto nem o motivo, mas lembro que ele me virava de ponta cabeça e caminhava comigo ali, segurando minhas pernas como se eu fosse um instrumento de semear, a cada passo minha cabeça tocava levemente o chão. Era engraçado...
Um dia ele teve de partir. Fora designado para outros lugares. Eu, nós, a comunidade e a cidade já amargava a futura caminhada com a ausência do nosso querido João. Haviam outras crianças, outros jovens e adultos, outros idosos que também teriam o privilégio de tê-lo como pastor. Nós, chorávamos sua partida.
Mais uma vez caio no mesmo pensamento: "as coisas quando são realizadas com amor, o resultado obtido é sempre melhor que o esperado." Sei que ele talvez nem se lembre da minha pessoa mas eu sei e mais uma vez carrego, não suas palavras, mas sua forma de viver aquilo que se prega. Sua vida foi e é o seu testemunho vivo de amor-doação.