O sertão é o sozinho, é dentro da gente, está em todo lugar. Deus e eu no sertão.
quarta-feira, 24 de outubro de 2018
O futuro num passado presente
"O ano é 2020.
O caos tornou-se uma realidade. A ditadura já havia ganhado a cabeça das pessoas. As eleições nem mesmo tinham acabado e a onda de violência já era noticiada. O presidente eleito até tentou conter os ânimos durante o primeiro mês. Só que a situação saiu de controle. Os apoiadores da ditadura sentiam-se não apenas no direito mas no dever de caçar e punir qualquer opositor que se manifestasse. Esse ainda era o ano de 2019.
Medo e insegurança nos olhares das pessoas. Sair de casa era um risco de não voltar mais. Grupos radicais faziam rondas por todas as ruas e bairros de cada cidade. Isso quando a própria polícia era quem reprimia descontroladamente a qualquer suspeito. Subversão e oposição ao sistema já era um crime.
Num dia de domingo fui abordado por policiais e automaticamente acusado de subversão. Minha família foi liberada para voltar pra casa, sem nada dizer, sem ter a quem recorrer. Nesse momento, o Estado era o dono da minha vida. O castigo era inevitável. Queriam, a todo custo, e por todos os meios, que eu assumisse uma culpa que não era devida. O meu silêncio custou caro, muita dor, muito sofrimento... e um fim iminente.
A pena de morte foi instituída nos primeiros meses do novo governo. Não precisava mais de um crime para ser penalizado e mandado para o abate. Bastava apenas pensar diferente... Esse foi o meu caso. Não deixei de escrever os pensamentos que iam de encontro ao sistema opressor. Não apenas eu, mas uma leva de companheiros e companheiras, tivemos o mesmo destino...
2019 foi considerado como o ano da caça as bruxas. Uma inquisição moderna que tinha alguns tentáculos religiosos unindo forças ao Estado. A minha sentença já era certa. Seria em praça pública, porém não mais numa fogueira, como na era medieval. Um tiro, por um soldado, ou por um lunático seguidor do governo que se habilitasse. Acredito que, no meu caso, haviam muitos interessados em apertar o gatilho, inclusive amigos e parentes.
Eu tinha direito a um último telefonema e desejei falar com o meu pai. Preferi que ninguém da minha família estivesse presente, mas fiz questão de me despedir e dizer que ele também foi iludido. Não tinha mágoa e por tanto não precisava perdoá-lo de nada, mas a dor que ele carregaria seria apenas dele... 'Adeus, Pai'. E meu corpo tombou numa praça em frente a uma capela."
PS.: Foi apenas um pesadelo, mas não estamos longe disso acontecer com pessoas que amamos.