terça-feira, 18 de fevereiro de 2014

Contrapostos: vida e morte.


No percurso natural ou rotineiro da vida, no ritmo desenfreado que seguimos nossos rumos, alguns fatos ou incidentes nos fazem parar e refletir, principalmente quando o inesperado é uma contraposição de tudo aquilo que acreditamos ser o leito natural das coisas.

Das utopias, das canções, das cenas protagonizadas de morte, nada cala e crava mais profundo do que quando ela retira de cena pessoas que, ao nosso ver, teriam muito a contribuir, a sorrir, a dividir... muito a viver.

Nesse contraposto que é a morte, a qual São Francisco de Assis chamava de irmã, vivemos sob sua mira, de que um dia, um dia bem longínquo nos renderemos e nos deitaremos em seus braços para a última travessia. É o que esperamos que aconteça, por mais que ela ainda nos seja assustadora, perturbadora e inexplicável, que esse último ato, essa última cena demore muito para chegar, o suficiente para permitir que nossos olhos assistam a muitos espetáculos dessa poesia viva.

Diante de alguns episódios tristes em que ela aparece sorrateiramente, tirando de cena ilustres protagonistas que assim os consideramos, deixando o palco da vida vazio, seus co-protagonistas sem ação e uma reticências para desfechar uma história... diante do silêncio da plateia, da busca em vão do holofote a encontrar a estrela principal, da apatia que perdura no entreolhar de cada um... diante desse mistério, com silêncio e dor, damos seguimento aos passos, ora cabisbaixos, ora fitando o céu à procura de uma resposta, um sinal pra se agarrar e não perder a esperança e o dever de continuar...

Ressurge assim, nesses momentos em que somos forçados a deixar a rotina de lado para chorar a partida antecipada de alguns, a interrogação: "De que vale toda essa correria? Pra que perder tanto tempo com futilidades? Por que não se permitir viver o que há de melhor nessa vida, família, amigos, amores...? Por que não tivemos tempo de um último abraço, um último olhar, uma despedida digna...? Por que não paramos e refletimos 'antes' o valor de nossa amizade? Por quê?...

Fazemos desse tempo de dor um tempo de forte introspecção, totalmente solitária. Amargamos como uma derrota, derrota para nós mesmos, pois só dependia unicamente de nós, no mínimo, viver um tempo da vida ao lado de quem já partira... Agarramos em pensamentos, a Deus, aos que ficaram, em dúvidas, na esperança de uma resposta que esse mesmo tempo se encarregará de amenizar e cicatrizar...

Não existe um remédio que nos previna da abstrata dor que corrói a alma em tempos de perda sem sentido. Se é que existe algum sentido para tal! Não existe hora marcada para a última cena. Não existe um tempo que nos permita preparar-nos. A vida, contraposto da morte, é ao mesmo tempo um espetáculo vivo de poesia e uma preparação contínua para o último ato que esperamos: o seja com honra e mérito! Existe apenas uma coisa a ser pensada: a morte, seja risco iminente ou não, também vira passado e na correria viva corremos o risco de voltar a pensar na importância dos nossos somente quando ela reaparecer e findar outro espetáculo... O tempo é agora, não é o amanhã. O amanhã é apenas uma semente que plantamos ontem, hoje, agora.

No palco da vida a morte até pode ser irmã mas também é vilã. Viver é preciso, sempre... Lembrar do que perdemos faz parte. Chorar o que poderíamos ter feito antes do ato final são lágrimas que poderíamos ter evitado dedicando um pouquinho do tempo a cultivar a semente que um dia plantamos ou que plantaram em nosso coração... Melhor uma flor entregue em mãos do que por sobre o caixão...

Obs.: Vale a pena escutar a música no link abaixo
http://www.youtube.com/watch?v=RKsC3MMlqtE