1994, aproximadamente. Eu tentava insistentemente atravessar uma
corda de náilon de uma ponta a outra pela parte superior da rede de vôlei. O canal era estreito e a
corda enroscava. Sem isso não poderíamos amarrar a rede aos mastros.
Desisti.
No quintal da casa do meu avô Joaquim, irritado por não conseguir
o feito, eu já me preparava para levar corda e rede ainda separadas para o
local onde jogaríamos uma partida de vôlei. Ele, meu avô, observando minha chateação aproximou-se e
perguntou o que eu queria fazer. Expliquei-lhe mas sem esperar que pudesse
dar-me alguma solução.
Meu avô era um homem do tipo bruto e carinhoso, estopim curto, de
poucas palavras mas de um amor sem precedente pelos netos. Eu, sendo o
primogênito, tive a honra e o privilégio de sentir e viver esse amor
incondicional, base forte de minha criação e educação. Meu berço é este. Sou
praticamente um filho de avôs e avós. Com muito orgulho por sinal.
Seu Joaquim, como era chamado pelos vizinhos e amigos, não sabia
ler nem escrever. Saíra de casa aos quatorze anos de idade. Casou-se com minha
avó Iolanda e teve três filhos: Carlos, o mais velho; Claudete, minha mãe; e
Clóvis, o caçula. Ele tinha um caderninho onde treinava sua assinatura. Gostava
de passar um tempo debruçado sobre o caderno na mesa repetindo aqueles
garranchos. Lembro-me que quando aprendi a ler e escrever por vezes tentei
ensinar-lhe algumas letras e palavras. Não obtive sucesso algum exceto a
atenção dos seus olhos amorosos, que, mesmo ciente de que não daria conta de
aprender nada, ainda assim, mantinha-se firme com total atenção e dedicação paternal de vô.
Bom, vô Joaquim, andou pelo quintal e voltou com um galho de
árvore de uns trinta centímetros. Analisou-o atentamente e com uma faca afinou
uma das pontas. Tratou também de tirar algumas imperfeições. Em seguida amarrou
a corda na outra extremidade da madeira. Sua ideia foi simplesmente genial. Ele
criou ali uma agulha improvisada, ou melhor, um guia para fazer a corda atravessar pelo canal superior da rede de vôlei. Deu certo.
É com saudade e orgulho que me recordo de momentos assim. Eu
estava lá, presenciando, vivenciando, aprendendo a consertar pequenas coisas
com improviso. Ele foi um verdadeiro mestre que fazia de seus consertos um
verdadeiro concerto para a vida. Sem estudo, mas repleto de uma
nobre sabedoria que até hoje me norteia na caminhada, seus feitos simplesmente
são uma obra de arte que perduram na eternidade da lembrança, no melhor canto
do meu coração. Sou grato a você meu avô, apenas por ser e estar sempre
presente em minha vida.
Joaquim Rosa da Silva - in
memorian.
* 17/05/1.933
+ 14/10/1.995