Quando penso no tempo
No que já foi e no que há de vir
Sinto-me como um rio
Que passa por entre margens
Redescobrindo paisagens
Contornando obstáculos
Seguindo seu destino
Mesmo sem visualizar o caminho
Mas sabendo do fim
Reencontrando com o mar
Voltando para casa
Se o mar é Deus
Que minha casa seja o céu
E que lá, quando me achegar
Eu possa misturar-me com outras águas,
Almas antigas e queridas
Fartando-me de saudosos abraços
E de água, de lágrimas...
Quando penso no tempo
Olho pelo caminho das águas
Toda a travessia
Em noites enluaradas
Manhãs de sol
Bem como os dias sombrios
E as noites escaldantes
Momentos em que o rio
Quase agoniza
Sem forças para prosseguir
E em algum momento
Do céu vem o retorno
Vem água, a chuva, a esperança
E os leitos se enchem
E tornam a vida ao seu redor
Menos sofrida, mais alegre
Mais viva
Quando penso no tempo
Olho para o horizonte
E vislumbro novos sonhos
Sonhos repletos de sentimentos
Esses que não cabem no peito
No leito
E transbordam para além de si
Para além da terra, da alma
E o maior de todos os sonhos
É o de reencontrar-me
Com outras águas de minha própria fonte
Este que ainda corre pequeno
Inocente, sereno...
Quando penso no tempo
Nesse tempo de agora
Por vezes, sem forças
Nem coragem de prosseguir
Sigo também empurrado
Por outras águas, outras almas
Rios irmãos que correm comigo em
paralelo
Ora se cruzando na travessia
E dando força na correnteza
Ou apenas sendo minha única força e
certeza
Ora sendo conduzido pela memória e
esperança
Para fortalecer as águas
Que nasceram de minhas entranhas
E então seguirei em paz, pelo amor
Em todas as estações
Celebrando o reencontro
Reencantando-me com as águas dos
meus...