Semana retrasada, minutos
antes de sair para o almoço o som da campainha do interfone não apenas
anuncia mas denuncia, tamanho é seu estrondo gritante: alguém do lado de fora
espera para ser atendido, ou talvez, ouvido.
A voz de um senhor em busca de um trabalho como cortar
grama, realizar podas nas árvores, cuidar de algum canteiro ou jardim, qualquer
coisa que pudesse render-lhe cinco reais. Esse era o valor da pedida que,
depois fui entender, seria para o almoço do dia.
Ainda pelo interfone ele justificou que estava muito difícil
conseguir trabalho e faria qualquer coisa necessária para garantir o almoço.
Foi fácil identificar que não era uma pessoa em busca de um trocado a qualquer
preço para depois gastar em drogas. Roupas simples, chinelo, boné, mãos
calejadas, traços típicos de um trabalhador braçal, sua expressão misturava
tristeza e esperança. Seu sorriso desproporcional era sincero. Pude ver e
sentir em seus olhos que a sua fé era tão viva quanto a esperança de encontrar ouvidos para sua história e
mãos que se estendessem-lhe neste momento.
Contou-me sobre sua esposa que estaria em outra cidade
fazendo tratamento de câncer. "A doença está bem avançada e eu entreguei
nas mãos de Deus." Ele aguarda o desfecho de sua aposentadoria que um advogado
está cuidando para retornar junto dela. Nesse período está estabelecido
numa pensão. Sem muitas opções sobrevive do esforço de seus braços, suor digno
de um homem humilde.
Sem muitas delongas dei-lhe um pouco mais do que havia
pedido. A alegria em seus olhos marejaram os meus. "Mas, tudo isso pra
mim?" Sim, respondi-lhe. Acreditei na sua sinceridade. Para a forma de seu agradecimento [...] não tenho palavras.
As linhas aqui estão bem longe de descrever o sentimento vivenciado ao
escutar este senhor contando sua história. Foi apenas mais uma voz ressoada
na imensidão desse mundo que por vezes se faz de deserto e nada escutam os
atarefados transeuntes penados.