"É
de sonho e de pó, o destino de um só..."
Chegado no local como de costume logo
percebi o canteiro da frente limpo. O mato arrancado permanecia ao lado. Quem o
fez com certeza retornaria para solicitar alguns trocados como pagamento pelo
serviço prestado.
Passaram-se pouco mais de uma hora e o interfone tocou. A
voz de um homem apresentando-se como o autor da benfeitoria, de forma humilde um "café" pedia. Enfaticamente despachei-o de imediato. Ele se foi e eu permaneci conscientemente inquieto. Estava errado.
Não poderia ter encerrado a conversa daquele jeito sem ao menos olhar seus
olhos. Algo maior motivou-me a ir ao seu encontro. Estava a mais de uma
quadra de distância. Tive de correr.
Chegando, perguntei-lhe se foi ele quem
tinha feito o serviço. Apresentei-me e quis saber seu nome. Olhar manso.
Semblante cansado. Mãos sujas e calejadas. Uma faquinha no bolso traseiro de
sua calça era a única ferramenta que dispunha. Nenhum vestígio de álcool. E,
mesmo se houvesse, não importava mais. Eu devia-lhe algo muito maior do que a
retribuição material. Devia-lhe uma merecida atenção, um olhar humano que
honrasse a sua pessoa. Respeito que quase faltei-lhe com minha prévia omissão.
No caminhar de uma quadra
até o início de tudo apenas seu olhar de esperança e gratidão e da minha parte o
sentimento de ter sido tocado no coração...Ele prontamente se pôs a limpar a
calçada e o restante do canteiro. Pediu-me um saco de lixo para juntar a
sujeira. Levei-lhe antes um copo com café.
O olhar é algo que dispensa
palavras. O dele é inigualável e tive a sensação que foi recíproco. Fomos
tocados. Assim que ele terminou o serviço me chamou. Entreguei-lhe um valor
que, tenho certeza, ele mesmo não esperava.
Agradecido ele partia satisfeito quando ainda ofereci-lhe uma marmita de comida. Novamente seu olhar transmitiu
serenidade e bondade em agradecimento. Arrumei e entreguei-lhe. O fato pode ter se encerrado no tempo
de algumas horas desta manhã mas a memória não. Ele voltará... Obrigado,
senhor Eduardo!