Caro amigo meu
Se infiel eu fui, foi
comigo mesmo, espero
Suas palavras batem
forte
Me traz a vida
E a dor de morte
Nem sei mais quem eu
fui
Da onde vim
Ou pra onde vou
Indiferente é onde
estou
Seja aqui, seja aí,
Em vão sinto que lutei
Realmente, vez ou
outra sinto essa brisa
Como se um sopro fosse
Em dias que o silêncio
me permito
Talvez, tenha
confundido os ópios
E ao invés de
omeprazol para queimação
Tomei foi dois
prozac's com Platão
Sarcasmo meu caro
amigo
Ainda não tenho essa
ferramenta última
Mas a brisa, o sopro
Que me sussurra ao pé
do ouvido
Quando cessa,
A minha instantânea alegria
A minha instantânea alegria
Sem eu perceber leva
consigo
Procuro o buraco
O canal por onde
adentra o vento
Nada, vazio, fechado
E no meio desse oco aqui
estou-me
Destoando entre notas
sustenidas
Menores, de tristeza,
empedernidas
Lamentando-me o
lamento mais lamentável
Canso-me de ouvir-me
E não consigo
escutar-me
Estou só?
Cá estou-me
Cá e só
Não é o cíclico da
vida que me angustia
Por mais que eu já
tenha observado essa espiral
A monotonia envolto da
matéria
A cegueira alheia é
pior que a minha
Ninguém enxerga nada
além do que se vê?
Estou aprisionado a
este ócio
Melhor mesmo, para
viver dentre os imortais
Estivesse envenenado
pelo ópio
Amigo meu, por que me
escreves?
Já não tenho mais
palavras
Nem de vida nem de
graça
Bons tempos aqueles
idos
No quintal de terra
batida
Entre couves e
hortelãs
A ameixeira era o meu
divã
Mocinhos e bandidos
No final da
brincadeira, todos amigos
Inventar a história,
Começo, meio e fim
Era a melhor das puras
redações
E a alegria vivia em
mim
Amigo meu, gostaria de
visualizar tua presença
Suas cartas me
reavivam
E pra vida me reativam
Mas elas cessam no meu
calar
Ouço, não ouço
Tudo se consome
Tudo se corrompe
Tudo se escoa pelo
tempo
E tempo, nem sei
quanto tempo ainda o tenho
Ou se é ele que me
consome
Me corrompe e me escoa
em si
Meu caro amigo
Que inflama este
infiel de si
Tanto quanto quero
reencontrá-lo
Mas antes, devo me
reencontrar primeiro
Antes que eu me torne
o derradeiro
A ousar a escapada
desta tormenta
Do vazio incrustado
que tanto lamento
Quero, tão somente,
não morrer em vão
Nem passar a vida em
busca de um sentido
Quero dar sentido ao
que me resta
No aguardo de tuas
novas batidas
Que me surram e me
acalentam
Despeço-me com, pelo
menos, um novo ar
O ar de tua anônima e
ausente presença.