segunda-feira, 29 de junho de 2015

O que nos torna capazes de Deus? - II



O que nos torna capazes de Deus?
A religião nos torna capazes de Deus?
É somente a religião que nos torna capazes de Deus?
Então, quem não tem religião não tem Deus?


Já observamos que para se ter uma experiência com o Sagrado não é necessário passar pelo crivo da religião e o que nos torna capazes de Deus não depende de nenhuma denominação religiosa. A religião em si significa "religar" e é apenas um caminho ou uma possibilidade deste encontro imanente-transcendente.

O que nos torna capazes de Deus está ligado às ações individuais que praticamos, as quais refletem diretamente nas pessoas dos círculos que participamos, seja na comunidade ou na sociedade em geral. A prática do bem não é exclusividade de religião alguma. É a escolha de uma conduta que aprendemos a desenvolver desde os primeiros passos da educação, ainda em casa. Está intrínseca na consciência de cada indivíduo.

A religião foca na boa conduta moral e na prática das boas ações explicitadas no cerne de seus livros sagrados e na tradição histórica. A partir de suas regras, promove um encontro individual e coletivo com o Sagrado. É preciso abster-se de particularidades e, de certa forma, aceitar a imposição institucional.

No cristianismo se afirmarmos e confrontarmos que quem não tem religião não tem Deus estamos indo contra a proposta do próprio Cristo que disse: "Eu vim para que TODOS tenham vida e a tenham em abundância". Jesus não mencionou que veio somente para os cristãos, uma vez que Ele mesmo era adepto do judaísmo. E. Durkhein afirma: "Não existe religião que seja falsa. Todas elas respondem, de formas diferentes, a condições dadas da existência humana." Assim sendo, nenhuma religião ou igreja são detentoras do Reino de Deus.

Papa Francisco em um de seus discursos deixou uma frase celebre: "Quem procura a igreja deve encontrar as portas abertas e não fiscais da fé." Sentindo que a igreja está muito mais institucionalizada e dessa forma impossibilitada de acolher os que a procuram, tamanho é o engessamento de suas estruturas, tem se portado aberto a acolher e dialogar em todos os níveis e sobre todos os assuntos que permeiam a sociedade. Ele mesmo é ciente que o Catolicismo, uma das opções do Cristianismo, não é o único caminho de salvação disponível e portanto tem deixado nítida sua preocupação com quem busca este encontro com o Sagrado.

Leonardo Boff uma vez indagou Dalai Lama sobre "qual seria a melhor religião?". A resposta foi desconcertante como afirma o próprio teólogo: "A melhor religião é aquela que te faz melhor". Não contente Boff ainda pergunta "e o que o faz melhor?" e para sua surpresa:  "Aquilo que te faz mais compassivo, aquilo que te faz mais sensível, mais desapegado, mais amoroso, mais humanitário, mais responsável... A religião que conseguir fazer isso de ti é a melhor religião." Nas próprias palavras do budista tibetano encontramos um tom de desapego religioso. Sua fala está muito mais voltada para a boa conduta que propriamente a um caminho de religião que possibilite o encontro com o Sagrado.

A experiência com o sagrado é individual e não depende de estruturas religiosas. O que passar disso é histeria coletiva (induzida pelo apelo emotivo). O trabalho sim, este é comunitário.


Ailton Domingues de Oliveira
Avaliação final de Filosofia da Religião
Prof.º Márcio Fernandes
4º Período de Teologia - FCU





sábado, 20 de junho de 2015

Carta de um errante solitário


A verdade é que nunca esqueci as distantes marcas
Assim como guardo o livro aberto
Daquele que docemente me abandonou
Guardo de ti o fel e o mel
Do passado que me corrói
Até a disputa do amor tão presente
E assim me pus a te deixar,
Todo dia um pouquinho
O medo de seus fantasmas te tirarem de mim
Foi mais forte e me fez reagir,
Na certeza de tão só prosseguir
A construção que pensei para nós
Só serviu para construir muro ao meu redor
O que eu passei no tempo de sua transição
Na verdade, me fez arrepender de ter-me entregado tanto
Descobri agora que o perdão não é uma opção
É uma luta diária onde o passado é vilão presente
Maior que a dor tem que ser o desejo de libertar-se
Aprendi, agora sei, mas não pratiquei... ainda não
O tempo e a ausência sua me ensinarão
Mais uma vez pela dor e a solidão
A levantar e caminhar...
Não soube e talvez nunca saberei esquecer-te
Tampouco das marcas da sofrência
Não desejei vingança
Mas afastar-me foi minha necessidade
E assim lapidei meu coração
Esfriei meu sentimento
E me coloquei na vala da solidão
Minhas crises eram luzes
Minhas luzes foram sombras
E nelas repouso em silêncio...
  


"Você pensa que quer desaparecer, mas tudo o que realmente quer é ser encontrado." (Autor desconhecido)


"Se existe uma solidão em que o solitário é um abandonado, existe outra onde ele é solitário porque os homens ainda não se juntaram a ele." (André Malraux)


"Na solidão, o solitário devora a si mesmo; na multidão devoram-no inúmeros. Então escolhe." (Friedrich Nietzsche)



segunda-feira, 8 de junho de 2015

Não! O show não tem que continuar!


Episódio de hoje: "A bagaça só termina quando digo amém! Améiiiimm?!"

Mais importante que a história a ser passada é o cenário com seus aparatos e a interpretação do elenco. O ambiente do palco tem que ser o mais perfeito possível. É preciso atingir o público, arrancar-lhe risos mas levar em conta a exacerbada preferência pelas lágrimas também. Sobrecarregar as emoções é garantir sucesso de bilheteria e aumento de público fiel. Reconhecimento, sucesso, estrelato, fama e patamares cada vez mais ambiciosos. É o que se busca.

Tudo seria normal se a realidade fosse nos palcos das artes cênicas. Não é o caso tratado neste escrito. Reconfiguremos a mesma situação num ambiente sacro, ou melhor, dentro dos pilares de uma igreja. Ousemos afunilar ainda mais e foquemos determinado movimento de uma igreja, a Igreja Católica. Chegaremos fatidicamente a um único denominador comum. Améim???

A arte de levar emoção aos fieis entranhou-se no seio dos movimentos católicos; estes que copiaram tal feito dos neo-pentecostais ao longo dos anos. O plágio não se deu somente na forma melancólica de ministrar encontros e eventos. Vai além, muito além. A imponência dos pregadores, que se portam como únicas pessoas capazes e escolhidas, se evidencia na tônica de suas palavras sempre acobertadas por um deus-castigador que lhes conferem o título de dono da fala.

Como disse, o plágio se estende além do que os olhos veem. Até mesmo a Teologia da Prosperidade, criada a partir de denominações como a IURD (Igreja Universal do Reino de Deus), não está mais incutida mas explicitada em atos e palavras das pregações que propiciam ao público leigo a insana interpretação de que "pessoa agraciada, ungida ou próspera, é aquela bem sucedida social e financeiramente; o contrário é o óbvio, quem não atingir e não conquistar sua graça nos moldes estipulados pela ordem dos movimentos corre o risco de levar o rótulo de amaldiçoado". Améim???

Parece arcaico mas é tão atual quanto real. Os movimentos que caminham em paralelo com a igreja tem suas regras próprias e por vezes destoam no que tange os princípios da instituição. Como diz Francisco "quem procura a igreja precisa encontrar as portas abertas e não fiscais da fé". A arte de rotular a quem não comunga da mesma ideia também faz parte da lista que fora importada de outras denominações. Apesar de que a nossa história também é rica nessa tarefa de rotular. Chega a ser uma santa e pecadora escola primeira. Mais pecadora do que santa.

Sempre me coloco em check diante dessa fala do Papa Chico. Estou sendo tão fiscal quanto os fiscais carismáticos? Ou, estou me tornando um fiscal que fiscaliza fiscais? Nem uma nem outra. O que ocorre é que não tem como evitar certos tipos de contatos e embates com pessoas que fazem do templo o seu espaço para um show particular, aonde o altar vira palco, os pregadores são os heróis ungidos que detém a palavra única de salvação e Aquele Moreno de Nazaré... Ah! É só um mero coadjuvante. Améim???

Pra conferir a balbúrdia desses encontros que se diz de oração, primeiramente passe perto da Universal e depois confira alguns encontros de Movimentos Carismáticos Católicos. A linha que separa uma da outra chega a ser somente a denominação. Verdadeiras primas siamesas. Sem querer ser "TÃO" pessimista mas tentando enxergar até onde e quando essa onda vai levar o senso crítico das pessoas, além do que a história já mostrou e diante do que concorre nesta realidade, só percebo que esse mesmo movimento tem forte tendência a se desvincular de seu berço romano e fundar sua própria instituição.

Talvez eu nem esteja por aqui pra ver esse bagaça virar a casaca, mas, por hora encerro esse monólogo de dois e sempre pensante no que ainda verei em breve. Sendo assim, para mim esse espetáculo vulgo sacro se acaba cada vez mais sem graça. Tão sem graça que os donos da bola nem se prestam a decorar o texto. O show é de improviso, o elenco é amador e sem perspectiva para melhorar; em suma, diante das palavras soltas de cada pregação, sem fundamento e sem argumento, os cabeças são destituídos de qualquer preparo. Mas, eles são "os escolhidos", né?! Quanto a nós, reles mortais, temos a opção de escolher um show de verdade para assistir, ou mudar de canal! Améim???