sexta-feira, 29 de maio de 2015

oS ridÍKulOs


Antes da pitoresca entrada solada, procurei o "pai-dos-burros" no google, facilmente acessível e acessável por qualquer um que queira satisfazer sua curiosidade quanto ao significado das palavras. No meu caso digitei "RIDÍCULO". Do resultado da pesquisa, sem tirar nem por, apenas copiei e colei da forma que segue abaixo:

a) Significado de Ridículo: adj. Risível; digno de riso; merecedor de escárnio ou de zombaria.
Insignificante; de valor irrisório; de pouco ou nenhum valor: quantia ridícula.
s.m. Pessoa que submete à zombaria, ao riso; quem se comporta ou diz algo que desperta o riso por ser muito engraçado ou constrangedor.
Algo ou alguém que é ridículo: o ridículo ainda não chegou?
Expor ao ridículo. Apresentar algo ou alguém de modo a causar risos.
Expor-se ao ridículo. Colocar-se numa situação de zombaria.
(Etm. do latim: ridiculu.a.um)


b) Sinônimos de Ridículo: esquisito, estrambólico, excêntrico, extravagante, heteróclito, insignificante risível
c) Antônimos de Ridículo: elegante, fino, chique, lógico, sensato e razoável

d) Definição de Ridículo:
Classe gramatical: adjetivo e substantivo masculino
Separação das sílabas: ri-dí-cu-lo
Plural: ridículos
*Fonte: www.dicio.com.br

Simbora que rapadura é doce mas num é mole não! O que sassucede é que niquiquando você discorda da opinião alheia, tem autor de alheice que se ofende e ataca barraqueiramente a tu, o discordante.

O episódio ocorreu numa instituição acadêmica. Professor, disciplina e tema não vêm ao caso. Participantes, entre eles estava eu, opinaram acerca do tema em discussão. Favoráveis, contras, alternativos e não optativos eram os que compunham a orquestra. Como em tudo que se refere a assuntos de ordem religiosa, principalmente quando se tratam de regras institucionais e dogmas de fé pouco conhecidas e discutidas, portanto mal interpretadas em sua maioria, onde a própria instituição religiosa ainda caminha rumo a melhores esclarecimentos e compreensão, toda opinião de qualquer leigo merece, no mínimo, respeito. É o que se espera de graduandos de um 4º período de Teologia que ali estão não por acaso.

A cena desrespeitosa foi que um participante esporádico, desconsiderando os comentários de um colega de sala, saiu do campo da discussão acadêmica e desdenhou com gestos e palavras a este. O colega apenas manteve o foco no embate. O participante reclusou-se no silêncio e no desdenho. Posterior a tal fato a sala manteve-se sem a presença esporádica de quem não gostou de ouvir outras vertentes sobre o mesmo assunto. Eu, quanto a essa digníssima ausência, quase não tenho dormido direito!

Não bastasse nos honrar com sua ausência ainda necessitou destilar sua profunda mágoa e incômodo, quanto ao episódio ocorrido a mais de mês e devidamente citado acima, contemplando nossa sala de "ridícula". Infelizmente, fui eu quem escutou no corredor desta instituição acadêmica a persona de orgulho ferida a nos adjetivar de ridículos. Aí pergunto: "Que tipo de teólogo vai sair dessa academia? Que tipo de líder é esse que não aceita discordância de sua opinião?" Pior que isso: "O que é que a pessoa desenrola e verbaliza nos momentos que ministra o seu movimento universitário?" Pseudo-cristianismo, eu penso!

Por isso me reservei, desde os primeiros momentos de faculdade, a não participar de certos eventos universitários que começam sem pé nem cabeça. Recusei veemente os inúmeros convites e afirmei que alguns movimentos acadêmico-religiosos não eram a minha praia! Geralmente quem atua em certas bandas religiosas que descartam o estudo e a discussão sadia e fincam o pé numa trilha regada de ingenuidade mística e espirituosa são travados para acolher o diferente. A acepção de pessoas já se dá a partir do pensamento alheio.

Estar num ambiente acadêmico requer, antes de qualquer coisa, prontidão para se desconstruir. Há quem queira somente o título e prefira manter sua catequese de raiz intocável. Enveredar pelo caminho da ciência é correr o risco de se deparar com verdades diferentes das que nos foram repassadas um dia. Se durante o percurso os sinais de fé se estremecerem com o novo isso não será o problema vital, mas é um grande sinal de que precisamos continuar buscando respostas. Todo o conhecimento deve propiciar-nos a desconstrução dos pensamentos e possibilitar-nos o reerguimento de um alicerce com verdades pertinentes à nossa caminhada de fé. Se ao final de quatro anos acadêmicos nada mudar, o tempo fora perdido.

Quanto a adjetivada que nos foi tacada não vejo como um peso negativo, quiçá desonroso, nem que influenciará na academia, tampouco na caminhada de fé. Quando crianças, épocas de pré-escola, quando o coleguinha dizia alguma coisa que não gostássemos a reação era mostrar a língua e xingar de chato. Em tempos acadêmicos a reação evoluiu para o desdenho e o ridículo. Pena que esse mesmo grau de evolução não se dê na abertura para o novo e para o diálogo saudável. De qualquer forma eu PREFIRO SER UM RIDÍCULO MAS VERDADEIRO A UM HIPÓCRITA E ALIENADO!

Ou, como diria o grande Rauzito: "Eu prefiro ser essa metamorfose ambulante do que ter aquela velha opinião formada sobre tudo."

sábado, 23 de maio de 2015

O que nos torna capazes de Deus?


Para ter uma experiência do Sagrado é necessário passar pelo crivo da religião?
Necessariamente não. Ela é um dos caminhos existentes para se experenciar com o Sagrado, mas não se encerra em si mesma como única opção.
A religião, em suma, deveria ser o caminho fiel para a pessoa conectar-se com o transcendente. Pode-se dizer que o é enquanto fonte de libertação ou não o é enquanto fonte de alienação. A linha que separa libertação de alienação é tênue. Ao mesmo tempo que a experiência com o Sagrado através da religião permite à pessoa liberta-se, de si mesma ou de opressões externas, poderá também ocorrer o oposto. Um único indivíduo corre o risco de passar por ambas as experiências repetidas vezes. Há que se considerar então como um verdadeiro círculo vicioso.
O que torna uma pessoa capaz do Sagrado não é necessariamente a religião. Esta, enquanto caminho e com seu fiel sentido de "religar", proporciona meios para um encontro imanente-transcendente.
Usando como exemplo apenas o cristianismo, pode-se dizer pautado na tradição escrita onde Jesus afirma "Eu vim para que todos tenham vida", que não há nenhum privilégio de salvação somente para as pessoas que seguem alguma ou determinada religião. Neste pronunciamento do Nazareno manifestado a todos não ocorre nenhum tipo de acepção de pessoas. Todos, simplesmente todos têm direito à vida e não somente os que estão inseridos em determinada denominação religiosa.
A experiência com o Sagrado deve transcender e superar todo e qualquer obstáculo. Se existir alguma regra imposta para a pessoa atingir o ápice desse "religamento" com o Transcendente há que se considerar a mesma como uma alienação mascarada. É o ópio oferecido de maneira disfarçada. Em contrapartida a religião deve permanecer fiel em seu caminhar, sem engessar-se em exageros e ao mesmo tempo propiciar a leveza do encontro com o Sagrado, melhor dizendo, com Deus. O papel da religião é criar de maneira simples este espaço de aproximação e experiência.
Particularmente, enquanto cristão e praticante, não preciso estar sob as asas da instituição para conectar-me à Deus. Professo minha fé Católica ciente do que tange as leis da Igreja, a Palavra de Jesus e a minha consciência humana. Respeitar os diversos tipos e possibilidades de encontro com o Sagrado é acreditar que a salvação está para todos tanto quanto este Transcendente que tudo criou.


Ailton Domingues de oliveira
IV Período Teologia - Trabalho de Filosofia da Religião – Prof.º Márcio Fernandes
Faculdade Católica de Uberlândia – Mar/15

Deus e o diabo no sertão


"666". Uau! Este é o escrito de número seiscentos e sessenta e seis. Pensei em usar o próprio número como tema mas, parei, pensei e recuei. Haveria um certo risco de deparar-me com uma comitiva inquisidora pronta pra me levar ao julgamento. Eu seria obrigado a renunciar o meu pensamento, pedir perdão pelas palavras usadas, ser pendurado em praça pública, uma fogueira pronta pra me consumir e com a gran'sentença da ex-comunhão institucional, etc.

Putz! Viajei legal! Nada disso sô! Apesar da sensibilidade exacerbada de alguns radicais, creio que não chegariam a tanto. Levando em conta que o próprio Moreno de Nazaré, Jesus, não sentenciou a ninguém, tampouco ex-comungou, o que pensam as mazelas do poder religioso não me incomoda. Relaxem que dói menos!

O "meia-meia-meia" seria o quê, então? Algo cabalístico? Apocalíptico? Os sorrateiros doutos da fé têm uma interpretação leviana e amadora. Utilizam o tema e suas nuances para armar um circo sobre seus altares. Um verdadeiro espetáculo forjado por oportunistas que objetivam holofotes, ibope e renda. Casadinha mega-infernal, por sinal. Ou, conspiração religiosa, pois precisam evidenciar o mal para que seus mega poderes sejam televisionados.

Em poucas inteiras palavras a Bíblia trata o 7 como o número da perfeição, portanto que representa o Bem, Deus. O 666 é a imperfeição que representa o mal, portanto nunca atingirá o estado perfeito. Do mais, é conversa midiática pra vender shows, CD's melodramáticos, e livros de auto-ajuda. As instituições precisam se manter, principalmente no que tange a vaidade de seus líderes.




Pegando um gancho do grande poeta dos sertões, João Guimarães Rosa, faço agora minha travessia nesse enlace escriturístico a provocar a sã demência dos livre pensadores, contrapondo a hipocrisia disfarçada dos mestres da lei e a "bestage" dos alienados à supra-corte hierárquica.

"O sertão é o sozinho, é dentro da gente, está em todo lugar (G. Rosa)." O sertão habita no universo de cada homem tanto quanto o bem e o mal que ele pode nutrir. O chão deste sertão é livre, quase terra sem lei ou terra de ninguém e nele se planta o que melhor lhe há de convir. Cada um planta o que tem. Se bom ou ruim, o gosto do fruto depende da escolha.

Por isso, a questão da existência do mal em tudo quanto é coisa que existe no sertão desse mundão parte muito mais da eloquente necessidade que muitos neuróticos da fé cultivam em si. Travar aquele espetáculo apocalíptico, típico de batalha de juízo final, ou star-wars, é indispensável para que na contra medida os experts da fé expunham seus multi poderes paranormais. E assim se dizem ungidos, poderosos, milagreiros. Os justiceiros do apocalipse, gladiadores do altar, e outras entidades pseudo cristãs são como os grandes inventores de anti-vírus. Primeiramente criam o vírus. Posterior, criam o antídoto e o vendem inescrupulosamente. É o sistema. Isso sim é uma conspiração de ordem social e com objetivos capitalistas e consumistas.

O fantasma do sertão de nós está extravasado do lado de dentro. Ele não se alimenta por si só. Requer trato especial, ou seja, quanto mais enfoque se dá mais ele se fortalece. Prático e necessário para a atualidade evidenciar o diabo. Pena que os sistemas de teologias usadas nos mercados religiosos servem apenas para massificar e alienar os seguidores. Construir uma cadeia de pensadores é escolha que atrapalha a fluência das valorosas bolsas religiosas.

Se a liberdade consiste em escolher o caminho, não há que insistir em endiabrar o sistema. O sertão está em todo lugar, está dentro de cada um. Nele, como todo homem que se é criação, a presença do bem e do mal existe. Da escolha de qual lado prevalecerá no controle é que dependerá a sobrevivência do errante solitário no sertão deste mundão. "Deus e eu no sertão."



segunda-feira, 18 de maio de 2015

Roupa de Missa


"Recordar é viver." Realmente, e como é bom recordar momentos especiais e pessoas importantes em nossa vida! E é com essa nostalgia que me pus a adocicar o dia com pitadas de boas lembranças regadas de muita saudade. 


No tempo em que morava com meus avôs Joaquim e Iolanda, onde tinha o meu cantinho com todas as minhas roupas, violão, cadernos e uma caixa de brinquedos guardada debaixo da cama, trago muitos ensinamentos expressados de maneira simples mas com uma profundidade de sabedoria indescritível. 

Parar e voltar o pensamento no tempo tem um significado enorme para mim. Não se basta em simplesmente lamentar e chorar pela ausência dos que amo. Vale também celebrar sua Páscoa, sua partida até o lugar que acredito que um dia nos reencontraremos.

Das frases guardadas no baú do coração tem uma que vem à mente cada vez que compro uma roupa nova. "Roupa nova é roupa de Missa!", dizia minha avó. E assim se procedia. As roupas recém compradas eram usadas primeiramente para ir à Igreja, na Missa no domingo de manhã. Era uma espera ansiosa mas valia a pena. Depois, já podia usá-las para outras ocasiões. 

De certa forma sua fala reflete até os dias de hoje. Por mais que eu não cumpra esse preceito tal como me foi passado ainda assim coloco-me a pensar na importância que minha avó dava ao Sagrado, o carinho com que me educava nos conformes da religião e o respeito que tinha para com a Igreja.

Respeitar sem questionar. Assim que sua educação foi baseada. Sei que ela quebrou barreiras para poder dialogar com o meu tempo. Acompanhou até aonde pode. Depois trilhei meu próprio caminho. 

Hoje, tanto tempo depois, eis que estou a interpretar o sentido das poucas palavras dessa frase que ouvi. A 25 ou 30 anos atrás não havia possibilidade de tantos questionamentos, nem tampouco a liberdade religiosa. Ou era de Deus ou era do diabo. Fazer o contrário do que a Igreja pregava era ruim. Era como ajuntar pontos negativos até o final de sua existência e no dia de sua passagem tudo lhe seria mostrado e pesado na balança: boas e más ações. Do resultado a sentença seria dada: céu ou inferno. 

Vó Landa tinha um zelo enorme pela Igreja, um amor admirável. Legião de Maria, Apostolado da Oração, Grupo de Oração e principalmente a Missa, não media esforços para dedicar seu tempo. Dia de novena de Nossa Senhora Aparecida não perdia uma. As rezas da Campanha da Fraternidade, do Natal e outras também estava lá. Queria me ver tocando violão na igreja. E eu o fiz. Mesmo em dias que demorava a voltar do passeio do sábado, as 7:30 horas da manhã de domingo já estava a postos para a Missa. Ai se não fosse!

Seu entendimento era limitado, tanto quanto sua pouca leitura. Praticamente soletrava picotadamente cada palavra quando se dispunha a ler a Bíblia. E lia todos os dias. Sabedoria, fé, respeito, amor, é isso que se resume aquela frase. Talvez quem leia ache graça ou até mesmo um absurdo, em dias de tanta tecnologia e liberdade desmedida, alguém se prestar a encontrar sentido numa frase dita a um adolescente a 30 anos atrás. Não importa! Cada um carrega e guarda aquilo que lhe convém. 

Estudarei eternamente tentando encontrar respostas para o sentido das coisas, frequentarei academias e me dedicarei a compreender ao menos um pouquinho sobre a fé que move montanhas mas tenho certeza: jamais alcançarei a sabedoria que eles tinham; jamais possuirei a fé que eles viviam. Levarei, então, por toda a minha existência tudo quanto eu puder carregar de seus ensinamentos, de suas sabedorias, de suas vidas.

segunda-feira, 11 de maio de 2015

Eternamente travessia


Somente uma casa no meio do nada
Sem sombra de pedras
Sem as copas dos monumentos
Que vedam o deleite da lua
E ofuscam as estrelas da cortina escura

Quero o silêncio da terra
O choro dos rios
O canto encantado da passarada
As cores da vida verdadeira
O desfecho que, tão a mim, espera

Quero a menina dos olhos
Dos olhos, a menina, me fulminam
Quero cantar-lhe meus cantos
E quando o pôr do sol se achegar
Tombaremos no regaço do abraço

Hei de recostar na rede
Que jaz permanente na varanda
Chamarei cada qual pelo nome
Enquanto a memória se perfazer viva
E no apagar das velas rezarei novamente

Na mesa grandiosa 
Ao redor comemoram cada meu
Histórias, memórias, glórias
Saudade, pensamentos, esperança
É o espaço de nós

Farei poesia a cada dia
Trarei pertinho meus poetas guerreiros
Entoarei hinos aos mártires
Saudarei minha terra com os meus
Minhas montanhas, meus sertões louvarei

Não guardarei mais passado
Trarei apenas lembranças de vida
Meus escritores para sempre do lado
Enquanto a luz ainda me guiar os olhos
E minha boca prosear sobre os tons

Tão duras estradas até aqui
Tão cruéis meus algozes
Tantos fantasmas que gerei e alimentei
Vão se desfazendo em cada estação que acheguei
E mais uma vez sigo o leito do peito

As cercas não têm porteiras
Bichos e gente vão se achegando
Meu altar é o chão com roseiras
O nascer de cada dia é o presente
Que a gente abre, abraça e sente

Minha história não terá fim
Meu nome ninguém saberá
Entre dores, amores e alegrias
Sei que vivi à frente de qualquer morte
Mas hei que um dia também serei travessia

Flores que rodeiam este sertão
Rios que cortam esta montanha
Fontes que o mundo não me deu
Altar que guerreei para encontrar
Silêncio, oração, esperança, amor: utopia


sexta-feira, 8 de maio de 2015

Cartas do Calabouço - Parte VIII - final



Não quero falar do tempo
Nem do tal amor...
Já não o sei que bicho é este
O que será?
De onde vem?
Como que se pega?
Dói e remedia, sim
Mas, já não sei como é que é
Se é ou não é
Se um dia eu amei
Se ao menos amar eu sei...
Na verdade não quero falar de nada mais
Trago aqui o meu despir
Despindo minhas máscaras
E despedindo por esta carta
Tenho um desejo, sei
De carregar o desejo livre
E isso é despojar-se do mundo inteiro
Tudo ao redor
Nada ao dispor
No voo da liberdade
A solidão é companheira no céu
Aquele culpado e inocente
Assentado como réu
Refém de seus algozes
Paixões do repente ferozes
Assim cá estou
Desmedido de meu eu
Corpo e alma se golpeiam
Razão e fé se contradizem
Minha vida nesta cela
De ossos, carne e sangue
Anseia um respiro mais puro
Sentir o enigma da montanha
Além dos sonhos e da esperança
Alimentar esta criança
Com a bruteza da doce natureza
Cá estamos num diálogo eternal
Sem fim mas que agora encerro
E um dia, quem sabe retomaremos
Sei que estás em mim
E eu em ti
Somos tal corpo e tal alma
Somos tal emoção e tal razão
Somos eu e meu eu
Imagem da imagem
Côncavo e convexo
Que em determinados pontos se contrapõe
Que em momentos vários se esquivam
Que em estações afora embarcam separadamente
Que por inúmeras vezes exigem a separação total
Mas não acontece
Porque somos corpo e alma
Minha cela está aberta
A tranca era de dentro
Valeu-nos as experiências trocadas
De maneira como se separados fôssemos
Hoje o silêncio foi possuidor de tudo
Esse mérito é nosso
Despeço-me daqui
Mas não me entristeço
Porque sei que este silêncio inquietante
É o sinal de que ainda fazemos valer a pena
Entre consciência, alma e corpo...
Pássaro só é livre quando voa
Bons céus para nós!

quarta-feira, 6 de maio de 2015

Crer e pensar para não se alienar - por Gilson Rocha

 É com satisfação que apresento e publico aqui, em "Escritos em Tempos", um texto de Gilson Rocha, amigo e também colega do curso de Teologia. É um pensamento intrigante, questionador, portanto nada convencional e que contrapõe muito do que nos foi ensinado, repassado ou imposto de forma não intencional. Vale a pena a leitura. Ailton Domingues de Oliveira





Vivemos num mundo da lógica, cerceados pelo acaso. Ando pelas ruas, e percebo a maravilha da criação. De uma pequenina flor que nasce na calçada ao complexo funcionamento do cérebro humano, que processa simultaneamente uma quantidade incrível de informações, que reconhece todas as cores e objetos que vê, que assimila a temperatura a sua volta, que escuta os sons ao seu redor... Torna-se evidente que crer na existência de um Ser Supremo - autor da ordem natural - não é uma questão de lógica, é um fato. Sim! Deus existe!

Ao mesmo tempo, observo as ações humanas - o descaso, a miséria, a sede por poder e a ganância -, fechados em sua individualidade, e me pergunto se este Ser Divino está conosco e nos acompanha em nossos atos. Nesse ponto, o questionamento e a falta da razão me ensurdecem. Como pode Deus, que é onipotente, onipresente e onisciente permitir que um filho venha a este mundo e morra por falta de um pedaço de pão? Ou que aconteça uma catástrofe de qualquer ordem que destrua a vida de centenas de famílias? Ou que exista tanta violência contra indefesos e fragilizados na sociedade em que vivemos?

Existe uma justificativa muito plausível que trata de um diálogo sobre a existência de Deus numa barbearia. O personagem descrente aponta que existem pessoas com o cabelo grande e barba mal tratada. Este fato, pela lógica, sustentaria a tese de que não existe o profissional. O barbeiro rebate dizendo que são as pessoas que não o procuram. A premissa é aplicada a Deus, que também existe; o problema é que as pessoas não o procuram. Mas isso traz um problema crucial quando inclui uma condição para o amor divino, e ao mesmo tempo não justifica que os bons e fiéis aos ensinamentos divinos também sofram com injustiças generalizadas.

Nesse ponto, a tese do livro arbítrio me parece o conceito exato que embasa o meu questionamento. Mas, ao mesmo tempo em que resolve algumas questões, levanta outras piores e mais ameaçadoras para a estrutura hierárquica e espiritual. Uma delas é: Se Deus não intervém em nossa realidade (pelo respeito ao livre arbítrio), qual seria o sentido de rezar ou pedir a intercessão divina? E se a razão de não intervir seja o fato de ele não poder fazê-lo? Mais complicado ainda, pois teríamos a ação de um elemento limitador do divino, ou seja, um SPP - Ser Supremo Superior.

Gosto de uma alegoria que compara a vida da “consciência” – ou alma, se preferir – a ciclos de passagem. Ela considera cada estágio como um percurso, e da mesma forma que passamos pelo ciclo da maternidade durante os nove meses da vida intrauterina, estamos também passando pela vida que conhecemos. Sempre me recordo do final do filme “MIB – homens de preto”, onde toda a galáxia que conhecemos não passa de uma bolinha de gude nas mãos de uma criança extraterrestre. Então, cada estágio tem suas peculiaridades e sua finitude. Mesmo que quiséssemos voltar à barriga materna, não sobreviveríamos àquelas condições, fazendo dele um estágio já percorrido que não tem volta. Quando nosso corpo já não mais aguentar, teremos iniciado uma nova jornada, e uma certeza é válida: será totalmente diferente do que conhecemos e até imaginamos, mas mesmo assim, será um novo estágio, e a premissa ainda é válida: não há retorno.

Pensando agora a partir da estrutura eclesial, percebo que a justiça - pelo seu caráter regulatório -, não consegue por si ser um instrumento de controle e motivação populacional, e nesse ponto, a(s) igreja(s) intervém com maior sucesso por estabelecer regras (mandamentos) de um Ser Supremo – inegável – e julgamento (pecado) aos infratores. Para imputar o castigo, justifica-se a criação da figura do Diabo, com um embasamento muito forte e até cativante. Isso responde qual o sentido da igreja enquanto instituição. Mas é perigoso pensar assim, já que a figura de Jesus Cristo enquanto divindade pode ser considerada como um pivô de manipulação em massa com objetivos políticos, em despeito da ação interventora do Ser Divino. E partindo do princípio em que o cristianismo se baseia, prefiro estar redondamente enganado em minhas teses hereges. A história, por sua vez, nos conta que isso é perfeitamente plausível, ainda mais sabendo que o campo da teologia não envolve certezas absolutas. É uma questão de fé! Mas assim também é de mistério.

E de repente, o que faz sentido é o contrário de tudo que me foi ensinado. E se o mal é fruto de escolhas, isso faz da serpente do Éden o motivo da sabedoria que temos hoje. E o mais interessante é perceber que a felicidade que tanto buscamos se faz presente na ignorância, e muito raramente na sapiência!

Tudo isso me leva para o lado de uma teologia de cunho realmente prático, que visa socorrer a humanidade no estágio em que estamos. Mais pautado no “aqui agora”. A humanidade precisa de socorro, e mais urgente que adoradores do invisível, está o cunho social e vivencial. Tratar do humano enquanto humano, nas necessidades básicas e ordinárias que a própria sociedade impõe. Esse modelo libertário de teologia traz consigo os seus atos em favor de uma fé, contrariamente às pautas, tratados e concílios, que antes de mais, parece-me que complicam mais que simplificam. É mais do mesmo.

Gilson Rocha - aluno do 4º Período do Curso de Teologia - FCU

terça-feira, 5 de maio de 2015

Vida virtual, morte real


O "já é hoje" se repete a todo momento de cada dia. É um tempo em que o tempo perpassa, descruza e enlaça a desmedida da vida, por vezes tão pouco vivida, que sem saber caminha insegura, infeliz, no sentido da morte que um dia certeiramente chegará. Viver é um dilema que requer a ingênua descompreensão das coisas. A recíproca deste viver que aflorada está em cada ser é que é o problema. 


Os devaneios, cada vez mais loucos e ousados, além dos olhares de custódia da ordem dos politicamente sensatos, são caminhos não só de libertação mas de busca de sentido real. Sentido este que tem se confrontado com a virtualização das relações.

Estamos reféns da tecnologia. Já não sobrevivemos sem esse aparato. As relações se perfazem em meio a comunicações digitais. Não há limites para o alcance dessa era tecnológica. O próprio facebook, vitrine para as novelas diárias da vida alheia, perdeu um pouco para o famoso whatsapp, a mais nova menina dos olhos da população de todas as classes. 

Sem muito mais explicações, nem tentativa de fazê-las, o que se percebe é um empobrecimento das relações nessa era de exagerada virtualização. Comunicar-se se faz por cliques. Pesquisas, estudos, reuniões, tudo está centralizado nesta dimensão virtual. Bibliotecas, já obsoletas para muitos e desconhecidas por grande parte das novas gerações, tendem a se transformar em museus.

Os comportamentos digitais, antes individualizados, tornaram-se coletivos e públicos. O tato, o olfato, a visão, o contato como um todo perdeu espaço para as mais novas figuras de comunicação disponíveis em cada nova invenção tecnológica. Essa necessidade de sintonia digital já impregnou no seio social. Poucos insurgentes, ou sobreviventes, de uma era mais real e palpável estão sentenciados a solidão ou então que se rendam à modernidade das comunicações em seus vários estilos.

Causa e efeito. Se, os efeitos desse excesso de tecnologia ou virtualização de tudo estão esfriando as formas de relação em sua essência, por outro lado, o caminho da desvirtualização tem causado o contrário: síndrome da abstinência. Abstinência virtual! 

Vida cíclica. Se, o fim de tudo é voltar ao começo, pois o novo está em redescobrir o que deixou de se viver, aprender e conhecer, então que seja logo. Este emaranhado de fios, arranha-céus, estão nos fazendo tropeçar nos obstáculos tridimensionais já não mais invisíveis. As pessoas, amorfas, de tão conectadas em seus aparelhos modernos caminham feito zumbis para não perderem a conexão com o mundo. Para estes só falta conhecer a vida e vivê-la pelo menos um pouquinho antes que o tempo desvirtualize-se de sua vida. Há um grande grande risco para muitos dessa nova geração que o primeiro contato com uma flor seja apenas no dia de seu velório. Assim caminha a humanidade.

Já é hoje... mais uma vez, é hoje!