segunda-feira, 23 de agosto de 2021

Recortes e Fotografias: arte e vida



"Hoje em dia é praticamente proibido não ser ambicioso" (Criminal - Reino Unido). Esse é um fato que observo já tem algum tempo. O comportamento das pessoas, da sociedade, grandes empresas, do mundo em si, é assim. Ambição por ganhos e lucros a qualquer custo. O crescimento só é válido se o retorno for de cunho material. Até mesmo as igrejas, em sua maioria, pregam isso através do que chamam de Teologia da Prosperidade. E muita gente cai nessa santa pegadinha. A ambição excessiva e ou obsessiva por alcançar os objetivos pode se tornar um fardo pesado na caminhada quando não há limites nem bom senso. Interessante aquela frase "a arte imita a vida e a vida imita a arte". Nesse caso, a arte imitou a vida. Uma série me trouxe à reflexão.

Dias atrás, assistindo outra série, "Quando chama o coração", com minha mãe, escutei uma frase de uma das personagens, a qual me chamou atenção para uma reflexão posterior. Anotei: "Eu não quero vencer na vida, quero viver". Parece uma simples frase de efeito, e é, porém não tão simples quanto parece. Entendo claramente que se olharmos friamente para a frase parece algo que soa como hipocrisia, pois não existe quem não queira vencer na vida. A diferença é que quem consegue aprofundar nesse pensamento, já se entende como vitorioso e feliz diante de suas conquistas e de sua vida. Claro que os bens materiais são importantes e necessários mas não estão em primeiro lugar. Nesse contexto, a personagem se dava por satisfeita vivendo sua vida em paz com a família numa cidade pacata de interior, enquanto outros a questionavam e tentavam persuadi-la a encarar novos desafios numa cidade grande. Ela já se considerava vencedora de suas escolhas e trajetória e vivendo com sua família era o ápice do sucesso.

Noutra semana me atentei para uma das músicas do Oswaldo Montenegro a qual ele enfatiza com  muita energia principalmente no refrão, que por sinal é o título da música: "Eu quero ser feliz agora". Novamente, arte e vida, vida e arte. A explosão intensa desse refrão funciona mais que um chamado, uma ordem para se viver bem, para ser feliz. Uma ordem para si e um convite para todos. Se atentarmos aos detalhes, se olharmos com clareza à nossa volta, procurando perceber além da engrenagem mecanizada que a sociedade vive, se conseguirmos nos despir das roupagens, máscaras e maquiagens que utilizamos constantemente, acredito que teremos oportunidade de rever a travessia e viver o que nos permite ser vivido. 

Viver e ser feliz, duas das maiores respostas que temos para os nossos próprios questionamentos internos. Ou que tal, melhor ainda: "Viver e não ter a vergonha de ser feliz!" (Gonzaguinha). E é com essa frase, que se tornou um verdadeiro grito de guerra da alegria, que deixo o recado: Nada é tão simples mas o sonho ainda não nos pode ser roubado! Diante disso, uma coisa é certa: Tenho urgência pra viver!

Recortes e Fotografias: fazendo a diferença



"Booom diiaaa!" Cumprimentou-nos a ciclista que pedalava numa das pistas que contornam o Rio Uberabinha. Estávamos fazendo uma caminhada matinal de domingo, eu e minha mãe, e cruzando com pessoas caminhando, correndo ou pedalando o tempo todo. O ambiente cercado de árvores que traz um ar de tranquilidade mistura-se por vezes com um certo mal cheiro que advém do rio. Várias pessoas nos cumprimentaram, mas essa ciclista, uma senhora por sinal, fez questão de nos cumprimentar olhando em nossa direção. Foi uma gentileza regada de vontade de transmitir um pouquinho de alegria. E toda alegria no mínimo tem de ser contagiante. 

Noutro dia, passeando com meu filho Felipe pelo shopping, entramos numa loja de tênis e numa livraria. Engraçado que sempre vamos aos mesmos lugares e o melhor é que temos praticamente os mesmos gostos. Quando eles não coincidem, sabemos exatamente que o que não me agrada, fica perfeitamente lindo nele e vice-versa. O que eu posso relatar desse dia foram duas pessoas, os dois atendentes que fizeram toda a diferença.

Na loja de tênis, o vendedor se aproximou e se colocou à disposição para me auxiliar, caso fosse preciso. Perguntei sobre tênis mais específico para uma caminhada e corrida. Ele perguntou minha preferência, e depois mostrou-me outra marca que eu não conhecia. Desse momento em diante, atento ao meu interesse e foco, ele explicou a diferença entre a marca que eu costumo usar e a que ele me apresentou. Posso dizer que foi uma aula sobre os tênis e a especificidade de cada um para determinados tipos de exercícios. Atentei-me principalmente quanto ao solado e o material inteligente que compõe todo o sistema de amortecimento de impacto que, segundo ele, não deforma o solado. É um material que depois de usado ele retorna ao estado natural. Por fim, não levei nada nesse dia mas quando resolvi, voltei com o mesmo vendedor. 

Já na loja de livros, uma perdição para meu vício, sempre tenho que me conter para não exagerar nas compras. Para mim, em especial, é um paraíso, um verdadeiro parque de diversões. Passaria horas na livraria olhando, conhecendo, experimentando um pouquinho de cada coisa e depois, com pesar, escolher apenas alguns para levar para casa. Nesse dia, em busca de alguns títulos específicos, me deparei com uma banca promocional do tipo "leve 3 e pague 2". Numa piscada eu já estava com 9 títulos à mão. Foi quando solicitei a ajuda de um vendedor. O rapaz, muito atencioso, não apenas me ajudou a escolher os 3 títulos que eu trouxe pra casa mas me levou para conhecer outros autores dentro da área que estava buscando. No final eu perguntei se ele havia feito filosofia. A resposta foi positiva e então adentramos em assuntos diversos sobre educação, filosofia, teologia e realidade. 

A diferença se faz não com belas palavras nem com atitudes para inflar o ego frente a holofotes. A coisa quanto mais simples, mais próxima da alma se achega. O bom dia da ciclista que expressava no seu olhar a vontade de transmitir alegria, a força de vontade do jovem e novato vendedor de tênis que passou um bom tempo explicando sobre as tecnologias de cada um mesmo sabendo que naquele dia eu não iria comprar nada e a transmissão de relevantes informações do vendedor de livros sobre temas variados que desprendeu tempo e boa vontade para me orientar na decisão de escolha foram verdadeiros recortes fotografados pelo click da sensibilidade e que de tão tocante fiz questão de registrar. Não sei se ainda os verei de alguma forma e nos lugares onde cruzamos, mas a experiência que me tocou é algo que é necessário compartilhar e trazer para os meus dias de forma que eu possa aprender mais e mais. São eventos do cotidianos que não precisam de diplomas nem de tecnologia mas de olhos atentos, olhos da alma.

Recortes e Fotografias: o casal na praça



Eram 7 horas da manhã quando eu passava de carro por uma rua que contorna uma pequena praça, próxima ao centro da cidade de Uberlândia. Ao diminuir a velocidade e parar até que o sinal do semáforo ficasse verde, avistei um casal num dos bancos da praça. Nada de anormal ou diferente do cotidiano a não ser pela cena que presenciei durante os poucos segundos que fiquei ali parado. 

O rapaz estava sentado bem à vontade, com os braços abertos sobre o encosto do banco e as pernas esticadas para frente. Acredito que a moça seja sua companheira devido à performance que realizava e pela forma com que o encarava. Ao som de uma música de celular ela dançava para ele. Não era uma dança vulgar, mas ela se dedicava a ele. Seus olhos miravam os dele em cada movimento. Ele, atentamente, acompanhava sem perder nem um instante do show. 

Não me importei se haviam uma ou duas garrafas no banco, bem como eles não se importavam com mais nada. O mundo era só deles. A praça tornou-se um palco que dispensava qualquer tipo de plateia. Os dois se bastavam. Não havia mais nada de importante que aquele momento, aquela troca de olhar que tocava na alma. Muita gente passava e buzinava, mexia, ria da cena. Eu apenas apreciei. Dispensei críticas que não me cabiam fazer sem conhecê-los de fato. 

Naquele momento, diante daquela cena de um casal apaixonado, numa manhã qualquer, a dança do amor deram a graça do dia. Não se precisa de muito para viver e se doar. Cada um se doa a partir do que tem. Eles tinham um ao outro. Olhos nos olhos, atenção, dedicação, sintonia, química e o mundo sob seus pés.

quinta-feira, 5 de agosto de 2021

Remanescente




Transformação e readaptação. Essas palavras trazem um pouco do que as pessoas tem vivido neste momento. Frente a pandemia que nos assola, o mundo passou e passa por mais uma transformação que mexe em todas as estruturas, de cada povo e suas mais diversas camadas sociais.

Readaptar-se faz parte de toda as etapas da travessia. Travessia, ao meu entendimento, consiste o espaço entre a primeira batida do coração até o último suspiro. Dali por diante nos manteremos vivos em nossas obras, no coração dos que amamos, no sangue que nos honra... Por isso, acredito que ela seja eterna, e um dia nos reveremos no Céu.

Readaptar-se, mesmo para os animais mais inteligentes do mundo, não é tarefa fácil. Seguir adiante entre golpes, quedas, perdas e lutas exige muito de si. Penso e sinto que a pandemia expôs o melhor e o pior de de cada um. Vimos por um lado a solidariedade, o amor e a compaixão fazendo a diferença. Por outro lado, a ganância e o poder, em mãos erradas, exacerbaram o que alguns líderes e seus seguidores tinham de pior: amor ao dinheiro e desprezo à vida humana. Isso se aplica em todos os campos da sociedade: empresas privadas, religiões, política, etc.

Além do que vivemos e sofremos em comum, presenciando tantas mortes precoces, experimentando a dor do luto alheio e próximo, ainda travamos nossas batalhas particulares que se desenrolam antes mesmo da pandemia. Resgatar o equilíbrio é um exercício diário e sabemos, nem todos conseguem sequer ter tempo para pensar.

Equilibrar problemas pessoais, transformações e readaptações, e encontrar razões para prosseguir é um verdadeiro ato de bravura, ou talvez a melhor forma de existir. Talvez, isso seja o maior sinônimo ou redefinição para resiliência.

Considero-me um remanescente, um amante da vida à moda antiga, que entre a dor e o amor, faço de cada passo uma vitória sobre o desconhecido. Não apenas sobrevivente, mas combatente de tantas guerras, que entre um golpe e outro, aprendi a suportar a dor causada pelo inimigo. Ferido por dentro, derramando em lágrimas de sangue, mas com a certeza de que a vitória é mérito para os justos.