sábado, 20 de dezembro de 2014

Agradecimento - Educadores e Educandos da FCU



“E agora, José? 
A festa acabou,
A luz apagou,
O povo sumiu,
A noite esfriou,
E agora, José? 

(Pausa)

E agora, José’s?
O período encerrou,
O ano acabou,
As notas vieram (...)
Vieram ?!!!
Enfim, férias.
Estamos de férias?!
Férias pra que, né, José’s?
Que nos venha 2.015!
Nos venham os trabalhos,
Nos venham as provas,
Até a tal da ABNT (...)
Que venha! Se quiser, é óbvio. 
Porque, José’s, vocês são os caras!”



Dois mil e quatorze foi um ano movimentado no ambiente acadêmico da Faculdade Católica de Uberlândia. Acreditamos SIM que o saldo foi positivo. Acreditamos, também, que podemos avançar e melhorar, tanto no individual quanto no coletivo. A evolução alcançada, aos nossos olhos, é medida pelo grau de satisfação tanto da “Casa” quanto de seus “Membros”. Não ousemos vendar os olhos para nossas falhas, isso seria hipocrisia. Ao contrário, assumamos nosso papel de verdadeiros educadores e educandos, com humildade, humanidade, dedicação e, principalmente, amor à causa. Quando o profissional, seja da parte de quem ensina ou da parte de quem aprende, esquece alguns valores humanos, coloca em xeque todo o trabalho empenhado e, assim, o tempo gasto pode ter sido em vão. Em contrapartida, quando o humano e o profissional se mesclam no individual de cada um de nós, o resultado alcançado é maior que o esperado.

Este ano que se encerra celebramos muitas conquistas mas, também, sofremos diante dos obstáculos da vida. Como uma família que se forma em cada turma de cada curso, nos solidarizamos com as dificuldades de nossos amigos e amigas. Muitas vezes o inexplicável e o fatídico nos deixaram um saldo de dor e incerteza sobre a vida. Alguns de nós experimentaram muitas dores como: distância de pessoas queridas, problemas de saúde na família e a perda de um ente querido para a morte. Neste último caso, um sentimento que o nosso lado humano ainda busca responder diante da ciência e da fé. Nessas horas, nesses momentos de angústia e sentimento de solidão, inevitáveis, podemos sim ultrapassar as barreiras institucionais para sermos simplesmente humanos. Esse é um papel para todos, principalmente, em nosso ambiente acadêmico.

Neste tempo de advento, celebremos, pois, a esperança depositada em cada membro desta imensa família que é a Faculdade Católica de Uberlândia. Que cada um possa cumprir com dignidade e honradez o seu papel na sociedade. Celebremos também a certeza que a ciência busca o seu melhor caminho com ética e respeito em prol da vida, da justiça e da verdade. Acreditemos, e nos empenhemos para tal, para que não façamos parte, simplesmente, de uma estatística de graduandos e graduados, ou, alunos e mestres, da cidade de Uberlândia. Sejamos mais! Sejamos um diferencial nesta sociedade e na vida de cada um que nos rodeia! E, então, celebremos com muito SONHO, muita FÉ e muita LUTA esse tempo de preparação para a chegada do Menino Deus, Ele que atravessa séculos e gerações com seus ensinamentos de amor. Abramos as portas de nossos corações e acolhamos com simplicidade Àquele que há de chegar e restaurar a Paz.

Feliz Natal a todos e que nos venha 2015 com muitas conquistas, Saúde, Paz e Amor!

quarta-feira, 17 de dezembro de 2014

Diário das diárias


Essas são algumas das partilhas com amigos e familiares que guardei com carinho desde o dia 23/11/14 (...)


Amigos (as), preciso da oração de vocês. Minha mãe teve um AVC. Ela está na cidade de João Pinheiro e deverá ser transferida para Patos, onde há mais recursos. Estamos tentando fazer a transferência direto para Uberlândia. Resolvendo algumas questões burocráticas irei para lá (Patos ou João Pinheiro), ainda hoje, sem previsão de retorno. Não dá pra descrever a sensação de impotência. Obrigado. (24/11/14)


Bom dia a todos/as! Depois de 48 horas conseguimos a remoção da minha mãe, de João Pinheiro para Uberlândia (Medicina). No momento aguardamos a disponibilidade de um leito. O quadro clínico dela é estável e sem sequelas aparentes, porém não deixa de ser grave e requer cuidados especiais urgentes. Apenas uma forte dor na cabeça, devido ao "derramamento de sangue" (segundo o médico). Chegamos ontem por volta de meia-noite. Passei a noite acompanhando e hoje a vida volta à sua rotina normal. Agradeço a todos pelas orações. Confesso que tive momentos que o deserto era tão solitário que o medo e a incerteza me tiravam o chão. Nessas horas fechava os olhos e buscava a Deus e tenho certeza de que foram nesses momentos que encontrei a força necessária que chegou através de suas orações. Abs. (26/11/14)


Bom dia! Lembrei-me de uma palestra que assistimos na FCU (semana da Teologia), onde o médico falava que quando a pessoa morre acaba se transformando numa "coisa". A sensação, diante de tudo que tenho vivenciado nesses dias, é que muitas vezes somos essa "coisa" ainda em vida. Encontramos pessoas e pessoas pelo caminho. Vejo "gente" que ama o que faz e se dedica com respeito, compaixão e caridade para com o próximo aqui pelos corredores deste imundo chão da saúde. Vejo também, sentindo na pele, o descaso, a frieza, em alguns olhares que dão a sensação que você - "a coisa" - é um "peso" neste sistema (da saúde). Flores entre pedras (ajuda e amizade de onde menos esperamos) e flores de plástico (enfeitam mas não tem vida, estão próximas mas são indiferentes). Minha mãe aguardava em jejum absoluto, para "fazer" um exame (nas artérias - esqueci o nome), desde domingo a noite. Ontem, depois de ter conseguido a liberação, após muita conversa de pé de orelha, após tentar encontrar um "ser-humano" por detrás daqueles olhares frios que me atendiam, nos informaram que o aparelho para o exame estava queimado. Teríamos que aguardar a liberação para fazer em outro local que tenha o aparelho. Sabe-se lá quantas horas, ou quantos dias mais! O responsável por correr atrás desta liberação, falou que ela então poderia se alimentar. Os enfermeiros não se responsabilizavam. O médico responsável, que só a recepcionou no primeiro dia (e todas as conversas que quis ter com ele, foram pelos corredores, isso quando tive a sorte de encontrá-lo, estava em cirurgia. Pelo bem, pelo mal, a autorização e responsabilidade foram minhas. Ninguém aguentaria, naquelas condições de forte dor na cabeça (por conta do derramamento de sangue), vômitos e mal estar (portanto, fraca e debilitada) a ficar mais um dia sem se alimentar. Autorizei, por conta e risco, porém, ciente do que ela precisava. As dores espaçaram e pelo menos ela conseguiu descansar um pouco (se é que existe descanso numa maca de hospital). Pra se ter uma ideia, ainda em João Pinheiro, somente uma injeção de "dolantina" conseguiu dar algumas horas de alívio. Comentei com o Gilson Rocha, a importância e necessidade de se fazer algo nessa questão, principalmente pra quem adentra no sistema de saúde. Desde João Pinheiro vi tantos casos, tantas cenas, dores que acabaram cruzando com as da minha mãe e com as nossas també
m (minha, da minha irmã e das pessoas que nos acompanharam). Somos impotentes, somos reféns. E com cada profissional que encontrei e encontro por esses corredores, tento enxergar e extrair um pouco do humano e mostrar que não somos meramente "coisa". Desculpem a extensão do desabafo, mas para mim escrever é libertar-se! Jaqueline, sua indicação foi muito importante pois acelerou o processo da transferência da minha mãe para Uberlândia. Hoje, estarei com minha mãe das 20 às 6:30. Abs e tenho sentido muita falta de estar com vocês! Continuo contando com suas orações. (27/11/14)


A linha que separa a realidade do imaginário e o sonho do pesadelo chega a ser imperceptível em situações extremas que fogem às rédeas do controle. Essa é a sensação do momento diante das circunstâncias que tenho vivido. E sei que o grau de cansaço, misturado com a oscilação da esperança com o medo e da impotência com a fé, está apenas no começo. Desde o domingo a noite quando minha mãe passou mal e foi socorrida pelo meu cunhado e por alguns vizinhos (em Brasilândia) até este exato momento, muitos, mas muitos nomes cruzaram nossos caminhos. Não sei se terei capacidade para tanto, mas fiz questão de guardar cada nome para que em breve possamos ofertá-los aos pés de Nossa Senhora Aparecida e de Nosso Senhor Jesus Cristo, em sinal de amizade e gratidão. Orações, ajudas frente às burocracias do sistema, telefonemas, mensagens, tudo tem sido fundamental. Minha mãe segue com fortes dores (...) Ver alguém que a gente ama sem forças e entregue numa cama de hospital, à espera que "amanhã" estará melhor e que tudo será mais fácil, confesso, queria eu estar em seu lugar. Já fiz essa proposta pra Deus, mas parece que Ele não me deu ouvidos. Neste momento minha poesia e minha teologia só tem um sentido: Mãe. (28/11/14)


Boas notícias!!! Ontem a tarde ela já estava melhor, se alimentou um pouquinho e começou a "dar ordens" pra mim e pra Cinthia (rs)! Hoje, acordou com fome. Um pouco da fraqueza se deu por conta de ficar 72 horas sem se alimentar. Juntando com a dor e as altas doses de medicamentos fortes deixava o quadro dela ainda pior. Entendemos agora que ela precisava reagir para que em caso de cirurgia esteja bem preparada. Agradecemos e contamos com suas orações. (29/11/14)



"A Família do corredor" - (01/12/14) - http://escritosemtempos.blogspot.com.br/2014/12/a-familia-do-corredor.html


"Vou fazer uma oração" - (01/12/14) - http://escritosemtempos.blogspot.com.br/2014/12/vou-fazer-uma-oracao.html

Bom dia! Vencemos a etapa do "exame". Acabou de ser realizado e possivelmente a cirurgia será ainda nesta semana. O médico que o realizou explicou-nos a situação. Disse que, apesar dela estar aparentemente bem, é um caso grave e por isso a urgência de fazer logo essa cirurgia. Mais uma vez, diante de tudo, contamos com a força da oração de todos vocês. Ailton e Cinthia. (02/12/14)


"Desfecho no Encontro" - (02/12/14) - http://escritosemtempos.blogspot.com.br/2014/12/desfecho-no-encontro-251114.html



Aguardamos ansiosos até a próxima segunda-feira (08/12/14), coincidentemente dia de Imaculada Conceição, para saber da Junta Médica qual será o procedimento necessário para minha mãe: cirurgia ou outro tipo de intervenção. (03/12/14)


"Uma noite, três histórias" - (03/12/14) -
http://escritosemtempos.blogspot.com.br/2014/12/uma-noite-tres-historias.html



No dia de Imaculada Conceição, aguardando a Junta Médica que decidirá qual procedimento será o mais indicado para o caso da minha mãe (cirurgia aberta ou via artéria), aproveito para agradecer alguns professores que foram, simplesmente, além de seu profissional. Foram humanos! Padre-Roberto Francisco e Silvano Dias, dispenso demais palavras de gratidão mas saibam que é um privilégio tê-los no rol dos Mestres e Amigos! Aos amigos da Teologia, agradeço imensamente pelas orações e força. E até o próximo período se Deus quiser. Imaculada Conceição Rogai por nós! (08/12/14)


Pessoal, acabamos de saber: a cirurgia da minha mãe será a tradicional (aberta) amanhã as 7:00 horas da manhã. Conto com a oração de vocês! E que Imaculada Conceição interceda por ela neste momento. (08/12/14)


"Nossa Senhora me dê a mão cuida do nosso coração que sempre bateu por nós: Mãe!" - (08/12/14)


Bom dia!
A cirurgia da minha mãe iniciou as 9 da manhã e acabou as 18:15 hrs. A demora foi devido a dificuldade de encontrar o local exato do aneurisma. Não teve complicações durante a cirurgia. Vimos ela no corredor, quando saiu da sala cirúrgica direto para a UTI. Apesar do sedativo respondia a todos os sinais e quando eu e minha irmã falamos com ela. Aguardamos por uma hora e depois a vimos novamente na UTI. Da mesma forma respondia que nos entendia. Segundo o neuro-cirurgião o quadro de saúde dela teve uma boa evolução desde o dia 23/11 quando teve o AVC. Ele não sabia explicar como que minha mãe não teve sequelas ou pior que isso, não morreu, pois é algo inexplicável para a ciência. Nos tranquilizou e também falou de todos os riscos. Na UTI, ouvimos a conversa de dois médicos, durante a troca de turno, sobre a boa evolução no quadro dela, o sucesso da cirurgia, e que ela respondia a todos os sinais e ao som de vozes. Aparentemente, não havia perdido nenhuma função e não precisou ser "entubada". Nesse momento, eu e a Cinthia apenas agradecemos a Deus e às orações de todos, pois nossa mãe é um milagre! O horário de visita na UTI é restrito. Após as 16 horas teremos mais notícias. Obrigado mais uma vez. (09/12/14)



Boa tarde! E, com muita alegria, já respirando aliviado, agradecendo a Deus e a todos pelas orações (...): minha mãe já foi transferida da UTI para o leito do Cirúrgica I. Ela está um pouco inchada mas passa bem. A emoção do nosso reencontro foi tanta que eu não contive as lágrimas. Lágrimas de felicidade e gratidão. Por fim, ela que falou pra eu me acalmar. Me contou detalhes de sua primeira noite na UTI. Reclamou de um enfermeiro que demonstrava desinteresse pelo trabalho (rs). Pra variar um pouco me deu "ordens". Rimos bastante quando falei que ia comprar um "berço" e colocar ao lado da minha cama, para quando saísse do hospital. Bom, é isso! Com certeza, o nosso Presente de Natal chegou antecipado! Pessoal, obrigado de coração pelas orações e pela força! (09/12/14)



"Nossa Mãe é um milagre" - (10/12/14) -
http://escritosemtempos.blogspot.com.br/2014/12/nossa-mae-e-um-milagre.html



"Jamais seremos os mesmos" - (11/12/14) -
http://escritosemtempos.blogspot.com.br/2014/12/jamais-seremos-como-antes.html




"Estradas que se cruzam" - (11/12/14) -
http://escritosemtempos.blogspot.com.br/2014/12/estradas-que-se-cruzam.html



Amigos, amigas, minha mãe já está em casa. Essa foi nossa última noite no hospital, Graças a Deus. As palavras finais do médico para minha irmã, antes da alta: "O caso da sua mãe é gravíssimo e ela está viva por um milagre. Agradeçam a Deus". Se a ciência, pelas Divinas mãos humanas, rendeu-se à Fé, só nos resta agradecer a Deus e à Nossa Senhora. Obrigado a todos pelas orações, principalmente. Com certeza nosso Natal será diferente! (15/12/14)

"A cadeira e o tempo" - (16/12/14) -
http://escritosemtempos.blogspot.com.br/2014/12/a-cadeira-e-o-tempo.html



"Sinais" - (17/12/14) -
http://escritosemtempos.blogspot.com.br/2014/12/sinais.html



"O mundo não parou na sua ausência, mas nós paramos o nosso mundo por você, Mãe. Nossa Senhora cuidou de ti." (15/12/14)












































Sinais


Não sei como realmente descrever cada detalhe dos dias que aguardamos pela minha mãe. Só sei que não canso de falar, ou melhor, de escrever. Cada momento, os de esperança ou desespero e incerteza, foi importante, mas, só agora, aos poucos, tentamos contemplar com gratidão e alegria a dimensão desses dias todos.

Sem querer ser redundante ou repetitivo no recontar dos fatos, algumas coisas gostaria de ressaltar mais uma vez. Vale a pena lembrar, degustar e novamente agradecer a Deus, a Nossa Senhora de Aparecida e às tantas orações que chegaram até minha mãe.

23/11/14 - O dia, ou melhor, a noite que minha mãe sentiu mal e foi socorrida por meu cunhado e alguns vizinhos em Brasilândia. A notícia veio através de minha irmã, pelo celular. Noite tensa, de terrível espera por notícias.

25/11/14 - No hospital de João Pinheiro, aguardando pela liberação da transferência para Uberlândia, caminhando pelo corredor deparo-me com uma Ministra da Eucaristia trazendo a Hóstia Consagrada. Suas palavras ressoam até agora ao meu ouvido: "Jesus vem lhe dar um abraço!" Continuei a caminhar rumo à saída mas acabei voltando e participando da celebração. Enquanto estava de joelhos, no momento do Pai-Nosso, minha irmã vem ao meu encontro e diz que só aguardávamos pela ambulância e a enfermeira que acompanharia na viagem. Vencido o primeiro obstáculo. Jesus Eucarístico se fez presente e nos deu o primeiro sinal para que não perdêssemos a fé.

26/11/14 - Madrugada no Hospital das Clínicas em Uberlândia. Corredor, sala improvisada, enfermaria dividida por 10 pacientes à espera, cenas e mais cenas. Enfim, o leito 112. Não sou adepto à numerologia, nem a superstições, mas, particularmente gosto do número 12 por que em outubro, nesse data, celebra-se o dia de Nossa Senhora de Aparecida e em dezembro o dia de Nossa Senhora de Guadalupe. Ambas, repletas de mística, devoção e Fé. O quarto 112 nos propiciou diversas amizades com outros pacientes e seus acompanhantes. Foi uma boa estadia.

08/12/14 - Segunda-feira. Dia de Imaculada Conceição. Novamente, mais que um simpático número, uma data marcante para nós Católicos. E foi nesse dia que uma Junta Médica se reuniu para definir o procedimento cirúrgico a ser adotado para dona Claudete. Com toda intervenção Divina e as orações de muitas pessoas, agendaram a cirurgia para o dia 09/12/14, as 7 horas da manhã.

09/12/14 - Passei a noite com minha mãe no hospital. Minha irmã chegou as 6:30 horas. No dia anterior pedi dispensa do trabalho para aguardar pelo resultado da cirurgia. Como só podia ficar um acompanhante, deixei minha irmã e voltei para o trabalho. As 16 horas voltei para a Medicina. Ela entrou para o centro cirúrgico as 9 horas da manhã e saiu as 18:15 horas. Nove horas e quinze minutos foram necessários. Sob a maca no corredor, companhada por duas enfermeiras, conseguimos falar algumas coisas. A cena era triste, pois ela estava sedada. Ainda assim, respondia com alguns sinais. Acompanhamos até a UTI. Estivemos alguns minutos e depois nos pediram para sair. Sua cabeça estava toda enfaixada. Segurei sua mão e pedi para que apertasse a minha caso estivesse me ouvindo. Ela apertou forte. Dali em diante, só aguardávamos o tempo passar. Espera torturante. 

10/12/14 - Foi uma noite de agonia. Esperar por notícias até as 15 horas desse dia seria uma eternidade. Junto com meu filho Felipe, passei por este deserto escuro e de medo. Algumas Ave-Marias foi o que consegui rezar depois de pedir a Deus pelo restabelecimento de minha mãe. Antes, o máximo que eu fizera foi o Sinal da Cruz. Não conseguia sequer cochilar. Chorei muitas vezes. Com a Cinthia, minha irmã, não foi diferente. Enfim, a hora de se levantar. Eram umas 13 horas quando meu celular tocou. Eu estava atendendo um cliente. Alguém da UTI do hospital solicitava minha presença para acompanhar a transferência da minha mãe para o leito normal. Não acreditei! Como que alguém após uma cirurgia de mais de 9 horas fica menos que 24 horas na UTI? Pensei o pior e que não queriam comunicar pelo telefone. Liguei para a Cinthia que imediatamente esboçou alegria pela notícia. Percebi que ela não notou minha preocupação. No caminho, questionei minha fé e repensei sobre a alegria de minha irmã. Será que eu estava sendo o "Tomé" da vez? E minha irmã, acreditou sem ter visto nem ouvido a notícia? Enfim, preciso rever meus conceitos e principalmente minha fé. Chego primeiro no hospital e subo para o quarto andar, local onde havíamos deixado nossa mãe no dia anterior. Identifico-me e após alguns minutos sou convidado a ir vê-la. Pensei que a cena seria a pior das piores. Mas, para que minha fé se restabelecesse, para que eu cresse, para provar o quão somos frágeis diante das intempéries da vida, eis que sou presenteado com minha mãe, de olhos bem arregalados e com um belo sorriso a me esperar. Ainda recebo uma bronca de brinde. Cobrou-me por não tê-la visitado antes (rs). Chorei na sua frente e foi ela que me consolou dizendo pra que eu parasse. Eu disse apenas que minhas lágrimas eram de felicidade. Minha irmã chega e aguarda ao lado de fora. Nos abraçamos e seguimos acompanhando até o novo leito, o 147.

12/12/14 - Para nossa surpresa, nesse dia de Nossa Senhora de Guadalupe, nossa mãe já estaria apta para ter alta, porém os médicos preferiram esperar até segunda-feira, dia 15/12. E foi neste dia que retornamos para casa com nosso maior "tesouro". 

Esses foram alguns marcos, dentre tantos outros que tivemos desde o dia 23/11/14.

terça-feira, 16 de dezembro de 2014

A cadeira e o tempo


Foi desta cadeira que compartilhamos de toda boa expectativa acerca da recuperação de minha mãe. Ao lado de seu leito nos estendíamos para alguns momentos de descanso. No hospital não existiam assentos confortáveis para todos os acompanhantes. Na verdade, creio eu, que não existam assentos confortáveis em hospitais. Toda vez que um paciente recebia alta havia uma disputa acirrada, uma lista de espera, por uma destas poltronas. Muitos dormiam sentados em cadeiras de plástico. Não foram poucas as cenas que presenciei de pessoas idosas debruçadas sobre o leito de seus entes, rendidas pelo cansaço.

Foi desta cadeira que ansiávamos em ritmo de espera, uma espera de aflição por não sabermos o dia que tudo estaria enfim no seu devido lugar. Em outras palavras, uma angústia imposta, por não termos sob o controle de nossas vontades ou sob os nossos comandos, ou, simplesmente por estarmos reféns da espera e do tempo. Esperávamos, que o tempo passasse logo, mas também, que tudo fosse feito conforme a vontade de Deus. Esperávamos, que a sabedoria humana, orquestrada pelas Mãos do Criador, resolvesse o problema. E foi assim, com muita fé, a fé que por vezes parecia sumir de nosso ser, mas que era trazida de volta pelas orações de tantos amigos e amigas, que hoje agradecemos a a Deus.

Dias antes da dona Claudete receber alta já havíamos conversado sobre a cadeira. Decidimos deixá-la, doá-la para quem precisasse. Andei pelo corredor em busca de uma pessoa sem a poltrona de acompanhante. Muita gente precisando! Meu Deus! Procurei então uma senhora, a camareira daquele turno, que sabia quais eram as necessidades mais urgentes. Sabemos que a doação é ínfima perante a demanda mas temos certeza que pelo menos uma pessoa será servida de alguns momentos de descanso para o corpo.

A cadeira ficará na lembrança das longas noites e dos papos diários na Medicina, tanto no 112 quanto no leito 147. É como deixar lá um pedacinho dessa história que vivenciamos ao lado de grandes e inesquecíveis pessoas: médicos, enfermeiras, pacientes e acompanhantes. Um gesto de gratidão nada comparado com o êxito na cirurgia de minha mãe, incluindo os procedimentos pré e pós operatórios. A camareira agradeceu imensamente e tão logo saíamos pelo corredor vimos no leito ao lado uma senhora recostando sobre ela.

Agora, em casa, relembramos as dores e agradecemos pela vida. O que antes chorávamos sem saber como orar, agora sorrimos, levantamos as mãos aos Céus e damos Graças a Deus. E ainda conseguimos transformar certos episódios em risos. Tudo, tudo, jamais poderá ser como antes.

segunda-feira, 15 de dezembro de 2014

Prática condicionada ou Fonte de libertação?


O não assumir uma postura frente a um empasse pode ser sim uma mera fuga. Medo ou receio, talvez! Pode também, ser simplesmente a hipocrisia disfarçada.

A opção de silenciar-se, não é mera fragilidade humana. Vai além das barreiras invisíveis que limitam a cada um. É manter-se neutro e, então, não responsável pelo resultado que virá. É um "lavar de mãos" ou uma saída estratégica pela tangente.

Uma pessoa que não tem peito para esboçar sua opinião é o tipo morno, que vive em cima do muro e tende a pular para onde for a melhor oportunidade. Velhaquismo puro ou falsidade?

Dizer aquilo que é conveniente para o momento não passa de politicagem barata. Não contradizer questões reais para andar sempre nas graças da realeza é ser o otário da corte.

Será essa a postura dos novos teólogos? Será uma teologia fonte de libertação ou uma prática teológica condicionada de acordo com o público em questão?

Você decide!


quinta-feira, 11 de dezembro de 2014

Estradas que se cruzam




Estradas que se cruzam, histórias que se entrelaçam,
Vidas que se achegam, memórias que celebraremos,
Eternamente.










Hoje, 11/12/14, adentrei mais uma vez aquele corredor da ala denominada Cirúrgica I - Hospital das Clínicas de Uberlândia (Medicina). Meu ombro já estava descansado, sem o peso da ansiedade e da espera por minha mãe. Aliviamos toneladas de tensão e saboreamos a sua recuperação, minuto a minuto.

Naquele corredor, sabemos, não era só a ela que necessitava de atenção com urgência. Muitos outros pacientes em situações, talvez, piores, também aguardavam o seu momento. Fui então visitar alguns leitos onde os enfermos e seus acompanhantes se fizeram próximos e solidários.

A começar pela nossa chegada na Medicina, madrugada do dia 26/11/14, enquanto aguardávamos no corredor por uma melhor acomodação para minha mãe, vi algumas cenas marcantes. Um casal de velhinhos, onde o senhor cuidava de sua esposa sobre a maca. Ele, sentado numa cadeira ao lado, sempre atento e prestativo aos movimentos dela. Amor e cumplicidade quase em extinção para os parâmetros modernos.

Ainda nesta madrugada uma mulher inerte sobre uma cadeira de rodas. Havia perdido um ente querido. Não soube se era seu marido ou filho. Ao seu redor vários familiares e amigos próximos a amparavam e sofriam a mesma dor. Ela, manteve-se forte sobre a cadeira, sem esboçar reação durante um bom tempo. Mas, a realidade lhe remeteu às lagrimas. No silêncio que já pairava naquela recepção fria eis que ela se desaba e leva outros pacientes à comoção. A morte, chega para todos e a vida deve ser vivida e celebrada a cada momento.

No corredor, onde nossa mãe aguarda pela alta médica, já famoso por nossas andanças, levaremos muitas recordações. Um rapaz, de frente ao leito 112, que aos 20 anos de idade fez duas cirurgias devido a um AVC, fora embora para sua casa na semana passada. Um senhor bem de idade que, durante a noite acompanha um paciente, pois a esposa só pode ficar durante o dia e os quatro filhos não se comprometem com o pai enfermo. De frente a este uma mulher também com aneurisma que teve seus dias de surto. Por fim caiu por cama e dali só piorou. Foi entubada, teve a morte cerebral confirmada e depois disso a falência múltipla dos órgãos. Dois filhos apenas sendo que a mulher de 23 anos demonstrava desinteresse e irresponsabilidade com a mãe. O rapaz de 20 anos, ao contrário do que a irmã dizia, foi mais humano, filho de verdade e muito mais responsável. Histórias e mais histórias de dor, superação, esperança e também de decepção.

Havia também no mesmo ambiente uma senhora, acompanhada pelo marido. Sem um pingo de humildade esboçava o descaso para com as outras pessoas. Sentia-se a melhor por ter uma condição financeira superior. Os pacientes que caiam com ela no mesmo quarto reclamavam. O tempo todo dizia que estava ali apenas porque a Medicina tinha os melhores aparelhos e médicos, pois, o seu convênio cobria qualquer hospital particular de Uberlândia.

As histórias que contamos e as figurinhas que trocamos madrugada afora ficarão seladas num grande álbum de recordação da memória. E não podíamos deixar de falar da companheira de quarto da mãe, a Fátima e sua mãe, dona Rita que a acompanhava. Pessoas simples que se tornaram praticamente familiares. Combinamos um encontro de comemoração, após a cirurgia de ambas.

Jamais seremos como antes



Desse tempo todo, desde aquele domingo, vinte e três de novembro de dois mil e quatorze, confesso que chorei apenas uns três dias. Isso na sua frente, porque nos outros dias, eu segurava as emoções para o silêncio do meu quarto ou bem longe de todas as vistas. 

Nosso encontro na UTI não podia ser diferente. A alegria de te ver com esses olhos arregalados foi inexplicável. Minhas lágrimas foram de alegria, muita alegria! Não podia agradecer a Deus de outra forma. Foram a minha melhor e mais sincera expressão de gratidão e fé ao Pai Criador que lhe deu simplesmente uma nova vida. 

Na verdade, eu esperava recepcioná-la, mas não, para minha surpresa, foi você no seu leito que me acolheu, me amparou e enxugou as minhas lágrimas. Ouvir você contar suas peripécias e desconversas durante a noite, no leito da UTI, foi o máximo. Sim, você está de volta! E agora, mais forte do que nunca.

Sei nada dessa vida mesmo. O quão frágeis somos e nos tornamos impotentes diante dessa fragilidade humana! O quanto dependemos dos outros e o quanto tudo isso é passageiro! O quanto perdemos tempo com futilidades e esquecemos de simplesmente viver e amar! O que sei mesmo é que não seria nada sem você por perto. 

E como não agradecer pelas mãos humanas que lhe operaram? Aqueles que cuidaram de você com simpatia ou com a falta dela. Os que cumpriram seu protocolo profissional e os que foram além, foram super humanos. Os que se fizeram perto e partilharam de nossas angústias através de orações e pensamentos positivos. Sim, Deus existe! E, foi Ele que orquestrou tudo isso em cada mão humana, em cada coração que se descompassou no ritmo dos nossos. 

Mãe, talvez não tenha ideia da dimensão desses dias de espera, de dor, de medo, de desespero que nos tomaram conta. Talvez não consiga imaginar a proporção que tudo isso chegou. Mas podemos dizer que centenas de pessoas partilharam de nossas angústias e intercederam por você. O que podemos agora é agradecer em orações e orações a Deus, por cada um que em determinado momento pensou positivo pela sua vida.

Mais uma vez: você re-nasceu! Deus lhe deu uma nova vida!

Disso tudo, sei que levaremos muitas lembranças. Pensaremos nas vidas que cruzaram com as nossas com muito zelo e carinho. Recordaremos as dores, maiores ou piores que as nossas, casos e mais casos, pessoas que conhecemos e cultivamos amizade, e, simplesmente agradeceremos a Deus por tudo. Do que foi tristeza, em ocasiões distintas, tenho certeza, faremos piada e daremos risadas, principalmente quando você der o seu ar da graça de boa contadora de história, da sua história de vida. 


Sei que ainda somos os mesmos mas, tenho certeza, jamais seremos como antes. Nosso Natal antecipou e você, Mãe, é o nosso maior presente!

quarta-feira, 10 de dezembro de 2014

Nossa mãe é um milagre


Milagres. Quando a ciência não tem a resposta diante do inexplicável, eis o milagre.

Dentre os corredores que pisamos, o do Hospital de João Pinheiro foi o que mais me marcou. O encontro com Jesus Eucarístico me alimentou de esperança. Senti que a Luz estava acesa em nossas vidas e que nossa mãe estava divinamente amparada.

As dificuldades burocráticas e humanas foram muitas mas as intervenções dos nossos amigos e amigas, verdadeiros "anjos sem asas", e das orações vindas de muitos cantos foram um pedacinho de céu para nós e especialmente para nossa mãe.

O medo foi implacável conosco. Sei que minha irmã Cinthia sofria pelo mesmo motivo, o de imaginar cada cantinho de nossas vidas sem o "pitaco" de nosso "Pilar". Esses quinze dias, desde a sua internação, experimentamos a dor da espera e novamente, feito obra Divina do Criador, dona Claudete supera o problema e surpreende a todos. Teve uma evolução inexplicável em seu quado clínico.

Ontem, dia 09/12/14, todo o procedimento cirúrgico teve aproximadamente nove horas e quinze minutos de duração. Uma verdadeira agonia. Ouvimos dos médicos palavras positivas acerca da cirurgia. Apesar da complexidade não houve nenhum agravante. O pós-operatório também é demorado e requer cuidados. Acreditamos que onde as mãos do homem não chegam, Deus se faz presente através das orações de cada um. É nisso que nos agarramos.

Por falar em oração, fiquei inerte e não conseguia sequer um "Pai-Nosso". Tentava falar com Deus. Pedia perdão por não conseguir sequer orar. O máximo que fazia era o Sinal da Cruz. Ainda ontem visitamos nossa mãe na UTI após a longa espera pelo fim da cirurgia. Ela nos ouvia e respondia balançando a cabeça. Em seguida passamos na capela do Hospital e, mais uma vez, diante do Santíssimo choramos e pedimos apenas por sua saúde e por uma boa recuperação para que possa continuar a nos "co-mandar" do jeito que sempre fez.

Li no Evangelho de hoje, que Jesus chamou para Si todos os que estavam cansados e fatigados sob o peso de seus próprios fardos pois N'Ele teriam descanso. Lembrei-me então de outras passagens, sempre tão tocantes e profundas em cada releitura, como a da mulher hemorroína que puxou o manto de Jesus quando ele passava pela multidão. Jesus sentiu uma força saindo de Si. A fé da mulher foi tanta que ficou curada. Noutra passagem, aquele que gritou "Jesus, filho de Davi, tem piedade de mim!" As pessoas tentavam intimidá-lo para que se calasse e ele gritava ainda mais alto. Jesus o escuta e a fé leva o homem à cura. São sinais, milagres que o tempo não apaga e que alimentam principalmente a nossa fé.

Inacreditavelmente quando minha mãe foi parar no quarto 112, automaticamente pensei no dia de Nossa Senhora de Aparecida, celebrado em 12 de outubro. Claro que era apenas uma coincidência mas uma coincidência divinamente boa. No dia 08 de dezembro decidem o procedimento cirúrgico mais apropriado e, mais uma vez, é o dia de Imaculada Conceição. Fatos, números, datas que ficarão eternamente em nossos corações. Enfim, já estamos com nossa fortaleza e agora entramos na etapa da "recuperação" e de muitos e muitos agradecimentos.

Por falar em agradecimento, começamos agradecendo a Deus que neste ano antecipou o nosso presente de Natal: nossa Mãe está conosco, renascida, reerguida.


Nossa Senhora me dê a mão, cuida do nosso coração que bate fora de nós: MÃE, nós te amamos! Ailton e Cinthia


Obs.: Enquanto eu escrevia este texto, aproximadamente as 13:20 horas, recebi um telefonema direto da UTI do Hospital das Clínicas. Pediram-me que acompanhasse minha mãe durante a transferência da UTI para o quarto. Avisei minha irmã e corri para lá. Ela ficou super feliz e eu com medo, pois pensei "como que uma pessoa, após uma cirurgia de quase 10 horas na cabeça, é liberada da UTI"? Ainda no caminho repensei que deveria ter a confiança e a alegria da minha irmã. "Senhor, eu creio, mas aumentai a minha fé!"

quarta-feira, 3 de dezembro de 2014

Uma noite, três histórias


Na noite do dia 24/11/14, no hospital de João Pinheiro (MG), enquanto minha mãe era medicada num quarto do pronto-socorro eis que algumas histórias me chamaram a atenção. Na verdade era impossível não perceber o que acontecia naquele reduto. 

Uma adolescente de aproximadamente 15 anos chega de ambulância direto da cidade de Brasilândia. Segundo sua mãe, a menina tomava banho descalça quando recebeu uma descarga elétrica no chuveiro. Era uma noite chuvosa e com muitos raios e trovões. Um desses raios caiu próximo de sua casa, o que, possivelmente atingiu sua filha no banho. Ela chegou com convulsões e queimaduras. Toda a equipe de plantão fora acionada. Os outros pacientes tiveram de aguardar. Um cardiologista foi requisitado às pressas. No desespero a mãe adentrava a sala onde faziam os primeiros socorros e saia aos prantos. Recostava sua cabeça na parede e pedia socorro à Deus para que salvasse sua menina. Não havia quem não se comovesse com a cena.

Uma hora depois, enquanto eu carregava meu celular na recepção do pronto-socorro chega uma senhora com fratura exposta na perna. Outra situação complicada e chocante. Nesse momento preferi não ficar perto. Fui para fora. De longe acompanhei a movimentação das pessoas que a trouxeram e juntamente com os enfermeiros a tiraram do carro. Ela aguardou um bom tempo no corredor até que houvesse profissionais disponíveis para atendê-la. Já não sabia o que era pior de se imaginar para aquela senhora: ser retirada do carro com sua perna enrolada numa toalha ou aguardar sobre uma maca naquele corredor tumultuado e nada higiênico.

A terceira cena que presenciei foi a chegada de uma mulher. Foi trazida num carro particular. Estava no banco de trás. Quatro homens a retiraram do veículo e assim que adentrou a recepção começou a se debater e gritar. Juntaram mais duas pessoas e ainda tiveram dificuldades para colocá-la sobre a maca. Sua filha e o porteiro a seguraram por algum tempo até que aplicaram-lhe uma injeção sedativa. A situação ficaria mais tensa. A mulher falava com uma voz estranha, como se não fosse ela. Xingava sua filha, o porteiro, os enfermeiros, a médica e quem cruzasse seu campo de visão. 

Sua filha contou que ela estava frequentando uns "centros esquisitos". Pouco depois revelou que a mãe havia feito uso de cocaína. Por fim, logo falaram pelo corredor que a mulher estava possuída de um espírito maligno. Levaram-na para um quarto e a amarraram na cama. Sua roupa estava toda molhada de xixi. Vou te contar uma coisa, com umas doses de sabe-se lá o quê fica facinho de encapetar o sistema. Lembro-me de uma vez que arrisquei tomar uma garrafa de San Remy no bico. Aff! Foi o bicho pegando! Mas fui curado com uma santa glicose e um belo sermão da minha mãe. Creio que deva ser o caso dessa senhora.

Ela continuava no xingamento total e sua filha, no desespero, saia para fora e chorava no corredor. Tentaram desamarrá-la mas quando o enfermeiro soltou uma das mãos tomou uma bolacha no pé do ouvido que deve ter ficado com o barulho de telefone ocupado até hoje. Ele ficou com tanta raiva que ligou para a polícia e exigiu que a mulher fosse presa por desacato e desrespeito ao funcionário público. A filha entrou em pânico. Nesse momento a moça caminhava pelo corredor rumo à saída e eu a chamei. Eu estava com uma camiseta de Imaculada Conceição. Disse-me que era católica. Só não entendi porque ligaram para o pastor. Enfim, ofereci algo que carrego com muita estima e devoção, um crucifixo de madeira com a medalha de São Bento. Fiz questão de anotar num pedaço de papel a oração de São Bento e entreguei-lhe com a Cruz. Falei pra ela rezar toda vez que entrasse no quarto. 

Enquanto isso, chegavam três viaturas policiais juntamente com mais duas motos. Eram dez homens para dar conta da pobre possuída que meteu a mão na cara do enfermeiro. Nada fizeram quando viram a mulher amarrada, se debatendo e falando com uma voz estranha. Formaram uma roda do lado de fora e ficaram falando sobre pessoas que pegavam espírito. Estavam era com medo. 

Passado alguns instantes chega um pastor e logo foi levado até a enferma. Mais uns minutos e chega um segundo pastor. Eita! Sessão de desencapetamento por volta das 23:30 horas deste dia. E agora, qual bandeira seria a responsável pelo caso da libertação dessa senhora? Após curarem a mulher, quem levaria a fama e o veredicto final? O babado tava louco e eu não podia falar pra doutora do caso que uma boa dose de glicose no ato e um bom sermão após doze horas seriam suficientes. 

Tive pena da filha que pagou o pato, passou vergonha e ainda implorou para não levarem sua mãe presa. O enfermeiro não quis dar continuidade na queixa. Ufa! Os policiais agradeceram. Ninguém queria encostar naquela pobre (...) Possuída?! Possuída sim, mas pela força do pózinho de pir-lim-pim-pim! 

Horas mais tarde, madrugada do dia 25/11/14, encontrei a filha da senhora (ainda acamada, porém livre e desamarrada) pelo corredor. Sua mãe estava tranquila. Passou o efeito das drogas e o sedativo a possuiu geral. A mulher havia acordado e não se lembrava de nada. Sentia dores nos braços e nas pernas onde foram amarrados. Não sabia como chegara ali. Sua voz estava mansa. 

Esses foram apenas os casos que presenciei. Não sei como foi que aconteceu, só sei que foi assim. Uma noite, três histórias: choque, fratura e desencapetamento do pir-lim-pim-pim.

terça-feira, 2 de dezembro de 2014

Desfecho no Encontro - 25/11/14


Eu caminhava pelo corredor rumo à saída. Precisava tomar um pouco de ar. Minha mãe já havia sido retirada do pronto-socorro e transferida para o leito de um quarto no hospital de João Pinheiro. A cem quilômetros de Brasilândia, cidade que minha irmã residia com seu marido e filhas até então e quase quatrocentos quilômetros de distância de Uberlândia, João Pinheiro, infelizmente, faz parte da estatística das cidades sem recursos à saúde, principalmente em casos em que a necessidade de um atendimento específico seja urgente. 

Desde domingo a noite (23/11/14), quando ela foi socorrida e levada por meu cunhado Lucas e alguns vizinhos para para o pronto-socorro de Brasilândia e posteriormente até João Pinheiro, permanecia no quarto das emergências. A visão deste ambiente era das piores. Poucos profissionais tem um atendimento adequado e ao nível merecido de cada ser humano. Desses dias guardamos o nome do Dr. Ricardo e da enfermeira Eva pela dedicação e respeito. 

Havia deixado minha mãe sob os cuidados da minha irmã. A pessoa que agora dividia o quarto com ela também havia sofrido um AVC, porém, suas condições eram bem piores. Apesar dos pesares e das fortes dores na cabeça, dona Claudete estava sem sequelas aparentes. 

Eram dezesseis e cinquenta e cinco e eu seguia caminhando por aquele corredor repleto de imagens que conseguia visualizar através das portas entre-abertas. Cenas que não tem descrição. Sofrimento estampado no semblante de cada habitante de cada quarto. 

Logo após seguir pela direita e depois para a esquerda avistei uma senhora de casaco branco, Ministra da Eucaristia, caminhando na minha direção. Carregava cuidadosamente, envolto numa toalhinha, o Corpo de Cristo. Com um sorriso singelo e tranquilo ela me abordou e disse: "Jesus vem até você te dar um abraço." Retribui o sorriso mas continuei meu caminhar à saída. Parei. Hesitei. Não podia mais continuar naquela direção e então voltei. Eu precisava retornar para dentro da capela, onde Ele se encontrava.

Era uma celebração simples mas profunda. Fui tocado de forma que não há explicação. Enquanto rezávamos o Pai-Nosso minha irmã vinha me contar algo: "Conseguimos o OK para a transferência da mãe para Uberlândia. Aguardamos apenas a chegada da enfermeira que irá acompanhando na ambulância." Foram quarenta e oito horas desde domingo. O quadro dela era estável e, apesar das dores que a deixavam inquieta, disse que queria assistir uma Missa na Nossa Senhora da Abadia, cidade de Romaria (MG).

Recebemos muito apoio e não tem como falar de cada um. Todos foram essenciais para chegarmos até aqui e continuam sendo especiais para nós. O que sei mesmo é que naquele momento em que Jesus Eucarístico passou por mim, sem eu perceber Ele resgatou minha fé, renovou minhas forças e nos trouxe esperança. 

Esse momento em especial havia partilhado apenas com dois amigos do Curso de Teologia, Gilson e Ricardo. Percebo agora que não é meramente um fato importante mas sim a história que vivenciamos nesses dias. É a história em que Jesus caminhou em nossa direção e se mostrou presente em nossas vidas. Quando mais sentimos o medo e a dor solitária da incerteza Ele vem até nós. E no desfecho desse encontro acalenta nossa alma e nos encoraja para a luta. 

segunda-feira, 1 de dezembro de 2014

A família do corredor


 De repente, a dor que sinto já não é meramente minha ou de minha irmã. De repente estou, estamos, compartilhando a dor alheia daqueles que passam por situações semelhantes ou piores à nossa.

Desde que minha mãe foi internada, (23/11/14), após sentir-se mal e ser socorrida por meu cunhado e alguns vizinhos da minha irmã, tenho notado e sentido o quanto nossas vidas tem cruzado com outras tantas pelos vários corredores que atravessamos até agora.

Nossa dor não é no corpo, mas dói de forma a nos retirar das cenas do mundo. Nos tornamos inertes aos fatos externos. O mundo parece não fazer sentido. Sentido está em nossa mãe. Sofremos por vivenciar ao seu lado as dores que a impossibilitam de ir e vir e de fazer suas rotinas diárias. Sofremos aguardando ao seu lado, pelos próximos procedimentos que a livrarão desta situação e lhe possibilitarão a retomada de sua vida. Sofremos unidos.

Uma movimentação maior que o normal acontece no quarto de frente ao 112. Todos os que acompanham os pacientes nos outros leitos se postam de prontidão nas portas de cada quarto. Enquanto o paciente é retirado às pressas por uma equipe de enfermeiros e médico uma senhora sofre em lágrimas. Soube mais tarde que ela é irmã do enfermo.

Todos sofrem juntos, todos os que ali presenciam sem nada poder fazer. São dores alheias que sentimos unidos no silêncio e na oração. Olhares aflitos que se cruzam. Orações que ressoam aos céus, à Deus, pelo paciente e sua acompanhante. Já sabemos um pouquinho da história de cada integrante deste corredor. Não somos mais desconhecidos. Somos mais que vizinhos. Somos uma família, uma grande família com diversos membros hospitalizados, em muitos quartos interligados por um imenso corredor.

O quarto, já o deixou de ser a muito tempo. Agora é uma casa. Um lar com duas camas. A cama é o lar. 112. Esse é o número de nossa atual hospedagem. Seguindo pela faixa preta afixada ao chão o destino será a "Cirúrgica I". Esse é o nosso endereço atual. Não existe quintal. Não tem varal. A cabeceira da cama já serve para esticar a toalha molhada. Sob a cama estão as malas. Eis o nosso guarda-roupa, guarda-sapatos, guarda tudo improvisado. Uma cadeira repousa o acompanhante da vez. Num pequeno armário de metal guardam-se alguns pertences.

A história da outra senhora que divide o quarto com minha mãe e ocupa o leito 113 é semelhante ao dela, pois aguarda há 35 dias por uma cirurgia. Minha mãe aguarda há 5 dias por um exame e depois deste saberemos do médico se o próximo passo será uma intervenção cirúrgica ou não.

No quarto da frente ao nosso, de onde aquele paciente foi retirado às pressas seu leito encontra-se vazio. Sua irmã espera seu retorno e busca conforto entre os que por ali passam. Nós, acompanhantes e alguns pacientes que já conseguem andar por conta própria, sentimos e compartilhamos essa espera angustiante. Choramos contido e não nos damos o direito de esboçar palavras. Respeitamos a dor do próximo que também é extensão da nossa.

O corredor nos une. O corredor é o centro de encontro da família, a grande e recém conhecida família. Os enfermeiros são os anjos que trazem o conforto em remédios para o corpo. Alguns ainda distribuem palavras para a alma. Diria o poeta, "nem tudo está perdido", pois ainda encontramos pessoas "humanas" entre os mortais. Os médicos são os senhores do tempo. Decidem. Sentenciam.Opinam sem muitas delongas. Os rostos que cruzamos pelas travessias desses corredores já são familiares. Ousamos nos cumprimentar. Passamos a entender o sentido daqueles que choram solitários. A dor é solitária, enquanto o sofrimento é compartilhado com os solidários.

Neste corredor não há uma crença que impere e domine. Existe apenas uma fé que nos une. Sabemos que há um Deus que nos ouve, acolhe, cuida através dos profissionais que aqui estão. Na teologia deste corredor, a vida acontece sem ritmo normal. A fé está no coração até mesmo dos céticos. A poesia se tece em gotas de esperança. 



sexta-feira, 21 de novembro de 2014

Linha do tempo


"Linha do tempo" foi o relato, o resumo de fatos da minha vida, apresentado e compartilhado no 3º Período de Teologia, disciplina de Bíblia III. Momento importante e de fortes emoções.

O primeiro filho; primeiro neto; primeiro bisneto; primeiro sobrinho. O fato de ter sido o primogênito e ter se mantido como único durante 10 anos, renderam-me várias regalias, coisas que meus avós sempre faziam questão de me contar. Ainda por conta dessa honraria toda, tive o privilégio de ter passado bons longos períodos na casa de meus avós paternos (Benedito e Maria Aparecida) e maternos (Joaquim e Iolanda), principalmente. Minha irmã, Cinthia, nasceu quando eu já tinha 10 anos, uma diferença de idade que não foi empecilho em nossa intensa relação de amizade e cumplicidade.

Meus pais, hoje separados, chegaram a participar do ECC e também do Cursilho. Meus avós (de ambas as partes), sempre foram católicos, mas do lado da minha mãe principalmente a religiosidade ainda era mais evidente e participativa. E foi graças a estes que minha base religiosa, considero, foi essencial para a formação.

Avó Iolanda, mãe da minha mãe, tinha um sonho: ver-me tocando violão na igreja. Esse gosto eu pude dar à família. Meu primeiro violão foi comprado em Aparecida no Norte quando eu tinha ainda 8 anos de idade. Tive duas aulas apenas. O resto foi esforço e vontade.

Professores. Sempre tive muita admiração e respeito por cada um que passou pela minha vida. Hoje, recordo com saudade e gratidão de cada um em particular, pois seus ensinamentos, fruto do amor com que se dedicavam à educação é trazido comigo no coração. 

Após a Crisma, entrei em grupo de adolescentes, passei para grupos de jovens, fui coordenador em ambos, coordenador da comunidade, da Paróquia, fiz parte da equipe de coordenação Diocesana e representava a Diocese no Sub-Regional. Tudo isso no ambiente Pastoral da Juventude. Enquanto participante dos grupos de adolescentes fiz muitos teatrinhos e escrevi alguns que ficaram marcados, um sobre "Família", outro intitulado "Menino de Rua", que guardo com carinho até hoje e um outro que foi sobre a história de vida dos meus coordenadores João e Marisa, meus grandes amigos e hoje compadres, pois me deram a honra de batizar o seu segundo filho, o Felipe. Fui um adolescente custoso, no sentido namoro. Nos retiros de adolescentes haviam sempre monitores olhando a turma de longe e uma dupla exclusiva para me olhar de perto. Lembro que quando a gente começava a namorar, o estilo autoritário e paternalístico dos coordenadores nos obrigava a contar para os pais, principalmente das meninas. Passei uma vez por essa corte! (Rs). Um dia, fui lá conversar com o pai da minha namoradinha. A primeira vez a gente nunca esquece. Nessa época haviam também muitos rivais. As famosas rinchas. Eu e mais 2 amigos não podíamos sair sós que o risco de ser linchado era grande. O motivo causador era simples, pois enquanto a molecada saia para aprontar farras e brigar, nós saímos para a famosa paquera, o início do "ficar". Essa diferença de atitudes pra época desqualificava nossos algozes para arrumar uma namoradinha e nos deixava em evidência. 

Tamanho e peso. Precisava superar meus limites. Não era muito bom com o futebol. O contato corporal no esporte me fazia ser um risco para a equipe. No menor dos esbarrões eis que o sangue quente subia rápido demais e a porrada corria solta. Eu precisava me superar tanto na questão disciplinar do auto-controle quanto na minha auto-confiança. Primeiramente o vôlei de dupla. Sábados e domingos eram numa quadra de cimento de um clube modesto da vila onde morava. Passávamos o dia, eu e mais alguns colegas, apenas com garrafas de água que levávamos de casa. Vez ou outra um pão com mortadela. Ainda no quesito superação, era necessário extravasar aquela energia de uma outra forma. Foi onde entrei para o Muay Thai. Foram 6 anos com direito a 5 lutas. Da mesma forma, sem altura e com peso baixo, precisava compensar com agilidade e esperteza para não ser apenas o saco de pancada da vez. E assim se fez. Das lutas, 4 foram vitórias. Apenas a primeira, para um exame de faixa com um graduado mais alto e mais pesado que o castigo foi forte. Ossos do ofício.

A fome pelo vôlei era tanta que aos 16 ou 17 anos, eu e mais um amigo da época movimentamos um torneio masculino e feminino entre as comunidades da Igreja Católica de Piraju. Conseguimos patrocínio, ganhamos uma semana grátis no Ginásio de Esportes da cidade, compramos um jogo de camisa, rede, bola e ainda contratamos os juízes. A abertura oficial do torneio contou com o ginásio lotado. A entrada dos times uniformizados com as respectivas bandeiras de sua comunidade deu um ar de seriedade e comprometimento mostrando que as disputas seriam acirradas. O pároco fez uma celebração abençoando aquele momento, os participantes e toda a comunidade presente. Haveria premiação para a melhor equipe, ou seja, aquela comunidade que conseguisse fazer seus times (masculino e feminino) chegar mais perto das finais. Os melhores atacantes, levantadores e destaques também seriam premiados. Mais uma vez, vai eu correr atrás do déficit de altura. Compensar de que forma? O peso leve me dava a vantagem da impulsão. Então, durante a preparação do campeonato que durou cerca de 2 a 3 meses restava-me trabalhar todos os fundamentos do vôlei para chegar ao melhor grau possível da perfeição. Trabalhava a impulsão correndo na areia e com exercícios específicos. O resultado foi positivo. Nossa comunidade ganhou em primeiro lugar no masculino e no feminino, levando assim o troféu de melhor equipe. Levamos também o destaque feminino, atacante masculino e por último eu fiquei com o troféu de melhor levantador da liga. Além desse torneio de equipes, realizamos outros 3 torneios de vôlei de dupla, dessa vez só entre as pessoas de nossa comunidade.

Amizade. Sempre fui dedicado com minhas amizades mas nem sempre a recíproca foi verdadeira. Hoje, olhando para trás, tento entender porque algumas pessoas às quais me dediquei só estiveram presentes enquanto precisavam de algo em troca. A pergunta já é uma resposta. Há amigos e amigos. O tempo se encarregou de afastar de mim aquilo que não era verdadeiro. Um desses amigos, ou ex amigo, é justamente este que foi meu parceiro em tantas partidas de vôlei de dupla e que me ajudou a organizar aquele torneio entre as comunidades. Por outro lado, algumas pessoas daquela época de adolescência, e que eu não tinha muita amizade, hoje nos aproximamos e nos redescobrimos. Para essas situações tenho alguns escritos no blog: "Controvérsias da Amizade I e II" e também "Defuntos Vivos".

Farmácia Drogamed. Um trabalho que durou 10 anos, rendeu-me experiência e uma amizade eterna. Heloise, foi mais que amiga, foi uma irmã. Torcemos para o mesmo time, Corinthians. Ela, fanática por esporte, também jogava futebol. Após 3 anos trabalhando comecei a receber propostas de outras concorrentes até que numa terceira ou quarta vez ela não quis cobrir e eu saí. Arrependimento desde o primeiro dia de trabalho no novo lugar. Foram quase 1,5 anos até que pedi as contas. Um representante de laboratório, amigo em comum entre eu e a Heloise, comentou com ela sobre minha saída da outra farmácia. Automaticamente, sem eu saber, ela dispensou um funcionário para me recontratar. Foi o céu para mim. Quando recomecei o trabalho com ela, logo percebi que havia algo estranho acontecendo. Ela e seu esposo (pessoa que guardo muita admiração e respeito) já não se entendiam bem. O tempo que ela estava deixando a farmácia para jogar futebol era o motivo mais aparente daquele clima hostil entre ambos. Fui me inteirando de tudo e percebendo muitas pessoas estranhas passando por ali, todas, fruto de sua nova fase de amizades trazidas pelo futebol. A separação deles coincidiu com a separação de meus pais. Fomos ponto de apoio um ao outro. E após o Curso de Inverno de 99, quando comentei com ela da experiência que vivi lá, ela abriu-me o coração. (...) Sua nova fase não seria fácil. Seus pais praticamente a condenaram. Hoje não mais. Está tudo resolvido na família. Mas, na época, somente eu, ali, de apoio. Durante muito tempo levava almoço de casa para ela.

Formei-me em Administração de Empresas em 1998 e foi no ano seguinte a experiência que considero como um divisor de águas em minha vida: o Curso de Inverno da Pastoral da Juventude. Foram 10 dias vivenciando a Espiritualidade - Sonho, Fé e a Luta - com irmãos e irmãs que congregam da mesma caminhada. Ainda neste ano, outros grandes marcos extra-caminhada aconteceram. Foi um grande amadurecimento enquanto pessoa.

Anos antes (1996), ou melhor, um ano após a morte do meu avô paterno, Joaquim (+ 1995), meus pais se separaram. Foi um grande obstáculo. Sentia a família desestruturando. Acabei me afastando de todo tipo de trabalho na comunidade, retornando no ano seguinte, 1997. A maior dificuldade foi assumir as responsabilidades de casa, coisa que o meu pai até então o fazia. 

No ano de 2000 mudei-me para São Paulo. Havia uma proposta de emprego modesta. Seria um novo começo. Seria. Fiz a entrevista e fui contratado juntamente com mais dois colegas. Morando na capital, logo no primeiro dia de trabalho, a diretoria daquela multinacional francesa negaria a contratação que o gerente realizara semanas antes. Ficamos na mão. Eu, demoraria 3 meses a conseguir meu primeiro emprego paulistano.Um longo período de deserto, solidão, medo e por vezes, desesperança. 

Na capital, jogando volei num condomínio em Alphaville, centro do capitalismo exacerbado, conheci um empresário de bom coração que me abriria as portas. Ele, convidou-me a trabalhar numa instituição, a qual era vice presidente, que cuidava de crianças em situação de risco de morte numa região conhecida como "triângulo da morte" (formada por 3 bairros de alta periculosidade e violência). Após 6 meses, seria transferido para seu escritório em Alphaville, que atuava como uma trading. 

Nesse período conheci a mãe do meu filho, Felipe. Cheguei a morar aqui durante um ano e meio mas acabei voltando pra capital paulista. Dois anos após o nosso rompimento, e já com quase 10 anos de São Paulo, resolvi deixar a vida com bons rendimentos financeiros para estar junto de meu filho. Foi a melhor escolha. Já se completam 6 anos de Uberlândia.

Meu filho. O Felipe foi desejado, foi querido e planejado. E ele sabe que toda a minha mudança é em prol de estarmos juntos, próximos e sempre unidos. Nossa relação pai e filho, posso dizer, que vai além de qualquer expectativa. Somos amigos e também confidentes. Temos carinho e respeito. Somos eternos companheiros.

Entre idas e vindas a escrita sempre esteve presente no meu dia a dia. Esse gosto (também pela Língua Portuguesa e pela Literatura) foi reforçado em 1993 por uma professora de Português, Ana Cristina. Desse ano que comecei a esboçar meus primeiros rabiscos de pensamentos. 99, seria meu último ano de escrito e retomaria somente em 2009, já morando em Uberlândia.

Durante os quatro festivais de músicas inéditas que aconteceram em Piraju, minha cidade natal, (1996 a 1999), juntamente com o grupo de canto que eu participava, ganhamos duas vezes em primeiro lugar, uma em segundo e outra em terceiro, todos com músicas de minha autoria. 

Em São Paulo cheguei a ficar 5 anos afastado totalmente da igreja. Foram épocas incertas. Páginas não escritas. Mas, num dia de domingo, resolvi dobrar os joelhos e pedi ajuda a Deus. Em menos de 30 dias eu já estava morando em Uberlândia e trabalhando. Sonho realizado. Tenho uma música escrita que conta em detalhes esse episódio com o título "O retorno". Há um sentido especial nesse retorno que simboliza não só a minha volta pra perto de meu filho mas também para perto de Deus e na caminhada pastoral na igreja. A partir desse domingo, após muita lágrima e conversa íntima com Deus, fui numa missa na Igreja de Nossa Senhora Aparecida em São Caetano do Sul, cidade que então morava. Salientando que minha comunidade em Piraju também era de Nossa Senhora Aparecida. Na semana que se seguiu, procurei me confessar e participar da Missa todos os dias as !5 horas na famosa igreja de Santa Edwirges. E, não lembro ao certo como e quando, mas creio que eu estava nessa igreja, numa dessas tardes, debruçado sobre o braço e pensando sobre o que seria o meu futuro próximo e ao mesmo tempo esperançoso de que algo bom aconteceria, de olhos fechados, a visão que me ocorreu foi "ao olhar do lado de dentro de um determinado lugar, lá fora havia um gramado bem verde e com algumas árvores". Só fui me dar conta do que seria isso, quando morando em Uberlândia, ao sair da Igreja de Imaculada Conceição, hoje minha comunidade, ao olhar para fora, vejo aquele mesmo gramado que havia visualizado quando ainda estava em São Paulo.

Num determinado momento, desempregado, ingressei-me no cursinho, específico para o Concurso da Polícia Federal. Lá conheci um capitão da polícia militar que atuava no batalhão de choque da capital. Esteve presente no fatídico episódio do Carandiru, onde resultou o filme. Fazia questão de falar como realmente acontecera naquele trágico dia, mas com o olhar de um PM a trabalho. Dizia que o filme era muito romântico e só mostrava um lado. O homem era louco. Puro sangue no "zói". Suas aulas eram motivadoras, engraçadas e me marcaram muito principalmente por sua coragem de nos contar tudo o que acontecia pelas ruas de SP. Ele era um cara perturbado. Tomava remédios controlados e não cansava de dizer que falava com os espíritos. Vez ou outra ele acaba falando alguma coisa sozinho. Ele dizia que havia uma velha que sempre o incomodava mas que não lhe causava medo. Ficamos próximos, trocamos muitas ideias. Apesar de sua vida louca, descontrolada, incerta, eu o admirava muito.

Nesse período, morando na casa de um primo, no Heliópolis (hoje não mais uma favela mas um bairro que pode ser considerado uma cidade à parte), conheci de perto vários tipos de personalidades locais: o assaltante, o traficante, os contrabandistas, os desviadores de cargas, os sequestradores, os golpistas de cartões, etc. O código de conduta local se resumia em poucas coisas. O principal era não ter nenhum tipo de confusão que pudesse trazer a polícia para dentro do bairro, uma vez que atrapalharia o tráfico. E quando tinha briga entre vizinhos chamava-se os líderes das bocas para apaziguar. Não resolvido, em última instância, viria o "chefe" (o cara que comanda geral) e neste momento ouviria a versão de cada parte e de mais duas testemunhas próximas. Era dado o ultimato. Se a parte errada voltasse a causar problema seria expulsa do local em menos de 24 horas. Muitos saíram dessa forma deixando todos os pertences para trás. Outro "artigo" do código de conduta seria a proibição de qualquer tipo de roubo entre vizinhos. Estupradores não tinham vez. Caso fossem pegos eram levados diretamente para o tribunal do tráfico. A sentença era a morte. Havia uma sala que ninguém sabia onde, conhecida como sala da "maquita". Ouvi histórias de pessoas que entraram lá para serem julgadas e condenadas e voltaram aos pedaços em sacos plásticos.

Recém chegado nesse lugar, meu primo sabendo que eu havia trabalhado em farmácia durante muito tempo, pediu-me para que fizesse um curativo na mão de um vizinho, amigo dele. Após todo o processo de assepsia e curativo sentamos à mesa para comer uma bandejada de peixe frito. Papo vai, papo vem, aquele senhor, nordestino, pedreiro forte começou a contar seus feitos. Simples, trabalhador, do tipo que não leva desaforo pra casa. O caso que mais me chamou a atenção foi como ele e seu compadre armaram uma emboscada para matar um "mala" que já havia matado algumas pessoas do bairro. Moradores da rua que seria o palco para o desfecho foram avisados com antecedência para que se recolhessem e não abrissem as janelas de suas casas em hipótese alguma. Outros duas pessoas, num total de quatro, fizeram parte do esquema. Uma pessoa numa esquina com chapéu na cabeça dava o sinal (abaixando seu chapéu) para um segundo que faria uma abordagem natural, tempo necessário para os dois compadres entrarem em cena para a cena final. Quando este segundo membro vira as costas chegam aqueles que acertariam as contas. Já cientes de que seu algoz, hoje no papel de vítima, não estaria armado, encurralam-no numa parede. Vieram de pontos diferentes impossibilitando que ele corresse para qualquer lado. Foram mais de 30 tiros e segundo relatos deste senhor da mão ferida, que eu acabara de cuidar, o cara ainda conseguiu se sentar no asfalto. O golpe final e brutal seria um bloco de concreto arremessado em sua cabeça.

Um jovem de 17 anos conhecido como Rubão, pessoa amável mas que praticava assalto. Almoçou várias vezes na minha casa. No seu aniversário de 18 anos, período em que eu trabalhava como representante de uma marca de energético importado, dei-lhe 2 desse produto para que festejasse. Ele dizia que as pessoas não acreditavam que ele duraria até a maioridade devido ao alto grau de perigo que se arriscava nas aventuras de roubo, enfrentando outros criminosos e também a polícia. 15 dias após seu aniversário chega a notícia de que ele fora pego com mais 3 colegas. Roubaram um banco mas havia gente que sabia do esquema do roubo e a ROTA (PM) estava na espreita. Bandido traindo bandido. Assim que eles saíram com o produto do roubo foram cercados e alvejados de tiros. Rubão, segundo relatos, sozinho conseguiu levar mais de 40 tiros. Seus braços chegaram a ser arrancados. Enfim, o que era a vida ali, naquele lugar?

No trânsito em SP. No auge de meus problemas, já com grandes perdas das figuras mais importantes da minha vida (meus avós maternos), a paciência e a calma não passava nem perto da minha lembrança. O trânsito da capital paulista não é apenas carregado pelo excesso de veículos. Existe um clima de tensão, medo, intolerância que ao menor do descuido pode ser fatal. Já fadado pelo estresse, pra não dizer desorientado, comecei a carregar um cabo de machado dentro do meu carro uma vez que se eu tivesse arma de fogo o resultado poderia ser ainda pior. Uma única vez passei por um desentendimento com um motorista de ônibus. O folgado não  me deixava entrar em sua frente e quando eu diminuía a velocidade ele também o fazia, impossibilitando de ficar em sua traseira. Numa brecha, acelerei o carro, passei à sua frente, parei o carro atravessado, abri a porta e desci. Cego de raiva, fui caminhando em direção ao ônibus (mas sem o cabo de machado). Chamei o motorista para fora. Xinguei-o de formas carinhosas que nem dá pra escrever (rs), sem contar os acenos. Ele não desceu, Graças a Deus. Não seria a minha hora de partir, nem tão  pouco a dele. 

A figura paterna na minha vida ressoa de várias formas. Meu pai, Derci, foi o famoso "herói e bandido". Nossa relação não é das melhores. Somos ausentes. Basicamente ele não sabe nada do que penso ou do que sinto. É uma ferida incurável. O que posso resumir de nós dois está no blog, com uma pasta somente de coisas que escrevi a nosso respeito. O mais marcante é "Doce Abandono". Dele, eu levo a experiência daquilo que eu não gostaria de me tornar: um ausente na vida de meu filho. 

Por outro lado, tenho em meus avós o exemplo de família, união, companheirismo, amor sincero mesmo diante das dificuldades. E é com essa simplicidade que procuro impulsionar minha vida e solidificar minha fé. 

Minha mãe, Claudete, considero uma pessoa guerreira, sofrida e também difícil de se entender, mas que está sempre pronta ao nosso lado. Nos acompanha, de perto ou de longe. E, por mais que não possa fazer ou dizer nada que melhore algumas situações adversas, o importante é saber que ela está ali.

Posso dizer que tenho muito mais dos meus avôs e avós que propriamente de meus pais. Tenho vários escritos que retratam um pouquinho de cada um desses quatro pilares da minha existência. Um, em especial, chama-se "Não aprendi dizer adeus".

Particularmente carregava uma certa dor de culpa, por não estar próximo de cada um deles, quando a vida lhes chegou ao fim. As lembranças são fortes e marcantes e não teria como retratar aqui. Hoje, mais maduro, entendo que nada do que estou vivendo seria possível se, naquele ano de 2000, numa noite fria e estrelada de junho, viajando madrugada adentro rumo ao sonho da conquista da cidade grande, entre móveis e esperança, deitado sob um colchão na carroceria de um caminhão, eu não tivesse ousado correr o risco de um futuro incerto ou promissor, ao qual hoje definiria como sonho. O futuro chegou e muitos sonhos também.

E pra finalizar deixo aqui duas estrofes de uma música de minha autoria que retratam tempos idos, tempos de agora e tempos que virão:

"Busquei meu motivo para viver
Descobri que nasci pra fazer
Não pra sentar e assistir a história acontecer"

"Sigo nos passos do Criador

Que abriu os braços e morreu por amor
Um destemido e sofrido que não se calou"

Música: Ideologia Santo Jovem - 1998

Ailton Domingues de Oliveira