segunda-feira, 13 de setembro de 2021

Ano 45


Queria talvez parar o tempo, voltar, controlar enfim. Mas só posso trazer de volta lembranças em forma de sonhos ou pesadelos. Reviver o que se passou é um processo de libertação de processos dolorosos, de reencontro com as vozes da sabedoria, de confronto consigo mesmo, de lágrimas de saudade, arrependimentos tardios, guerras internas e batalhas reais.
O tempo escoa feito areia pelas mãos. E as ações reverberam tempo afora. Ficam memórias, histórias, tristezas, certezas, saudades, possibilidades e sonhos. Tons, sobre-tons, sons e todas as suas derivações maiores e menores que a aquarela da vida pode entoar, cantar, pintar, poetizar...

Entre uma primavera e outra, as estações me abrigam em momentos de sonhos, fé e luta, ou me obrigam a rever os passos em cada ciclo, cada obstáculo, cada espinho, cada batalha travada, com cheiro de lona ou de vitória.

Meus poemas nascem na fonte, e a boca que a toca é única. Entre o sentimento épico sem liberdade e a muralha medieval de oposições, vivo no limiar de todas as batalhas, sem saber se haverá uma próxima vez. Pela pureza da água que corre entre os leitos e os lábios, driblando cada pedra, assim é a esperança que não dorme. Em cada manhã a porteira se abre esperando a chegada da luz que se irradia no reflexo do olhar. E como os leitos esperam a água em ciclos, o lábios esperam o beijo eterno.

Cá de dentro, já sou feliz e grato pela vida que vivi, vivo, e que ainda tenho a escrever pelas linhas deste tempo. Meu maior legado pulsa fora do meu corpo, meus meninos, meus orgulhos, o melhor de mim. E entre as estruturas familiar e de amizade toda a maldade foi sendo vencida. Meu mundo simples de poemas, leituras, artes e busca por conhecimento, cabe ainda sentimentos que se misturam entre sonhos e raízes, suor e flores.  

Sob a luz do senso-crítico tornei-me incansável combatente à hipocrisia que se disfarça na sociedade, mascarada de pseudos religiosos e corrompidos políticos. A falsidade incutida em quem se vende pelo poder não fica escondida por muito tempo. Assim, a máscara maquiada se dissolve na mesma linha de tempo que consome os dias. Há quem será lembrado de maneira honrosa por suas lutas, mesmo que o resultado seja derrota. Mas pior será para quem se vendeu e venceu sorrateiramente, este ficará à margem da história, sem honra nem glória.

O tempo de agora requer mais que reflexão, inspira cuidado para com o amor, esperança para quem não enxerga e coragem para quem se levanta. Neste ano 45, agradeço pelo que sou, pelo que me tornei, aonde cheguei. De nada valeria cada passo dado se não fosse o legado que me importa honrar, se não fosse os amigos que vivenciaram cada batalha ao meu lado, se não fosse o sentimento que me fez acreditar que tudo, tudo vale a pena. 

45 e muitos sonhos, muito desejo de viver, muita vontade de lutar. Que não me falte a coragem para viver e honrar ao sangue que corre nas veias, nas minhas e dos meus. 

"Porque metade de mim é amor
E a outra também"