sexta-feira, 24 de março de 2023

Travessia PJ



Entrei no que a gente chamava de comunidade, primeiramente no grupo de canto da Comunidade de Nossa Senhora Aparecida, também conhecida como Comunidade da Vila Cantizani, em Piraju, São Paulo. Eu tinha uns 9 anos de idade e esse grupo de canto era formado por adultos, jovens, adolescentes e crianças. Nesse período comecei a tocar violão nas missas. Os grupos de jovens ainda eram constituídos por muitas pessoas, chegando a somar mais de 100. Lembro da transição feita de grupão para grupos menores, os grupos de base. Quando acabou o Crisma, fui para o grupo de adolescentes. Os roteiros de reuniões ainda eram diversificados, em sua maioria nada dinâmicos. De forma inocentemente engessada, as reuniões eram basicamente estudos em que só o coordenador lia algo, comentava e depois abria para discussões, o que quase nem sempre havia participação. Eu tinha 14 anos. 

A partir de 1996/97, com 20 anos respectivamente, conheci de fato a Pastoral da Juventude, sua estrutura, espiritualidade e modos de ação. Sua história de lutas me encantou. Foi uma história de amor e libertação que se perpetua nos meus dias de travessia. Dentro do ambiente católico também conheci outras linhas de ação de movimentos de massa mas, foi a PJ, sua caminhada de sonho-fé-luta que constituiu toda a minha base de pessoa, cristão, ser humano, de forma especial.

Antes mesmo de conhecer a PJ eu já buscava por algo diferente do convencional, não queria mais do mesmo. E sem saber eu já ansiava por esse "novo" que tivesse uma práxis libertadora. Na época, ainda adolescente e instigado por inquietudes inexplicáveis e questionamentos que me gritavam internamente sobre a estrutura engessada de todo tipo de sistema, eu já era PJoteiro. Era uma questão de tempo para que esse encontro acontecesse. 

1998 foi o ano em que o mergulho nas águas da PJ foi realmente profundo, transformador, libertador e gratificante. O meu marco referencial foi o Curso de Inverno na cidade de Araçatuba (SP), desse mesmo ano. 1998 a 2000 foi um triênio de uma travessia ímpar. Após me afastar literalmente dos trabalhos pastorais da Comunidade devido a questões familiares, em meados de 95 até 1996, meu retorno se deu com um convite para trabalhar com grupo de adolescentes. Fiquei pensativo por alguns dias antes de dar a resposta oficial mas, em meu coração, já havia um SIM. Eu só precisava mentalizar e fortalecer como que trabalharia e me dedicaria nesse projeto com os adolescentes.

Foi uma entrega maravilhosa, com muito amor e dedicação. O resultado foi o crescimento de um grupo de adolescentes repleto de sonhos, alegria contagiante, inquietos, questionadores e com um senso-crítico para lá de aguçado. Era o grupo ABC. Em um ano, esse grupo se tornou uma espécie de referência e havia muita procura de adolescentes de outras comunidades para fazer parte do ABC. Reabrimos o grupo mas foi necessário dividir. Vieram mais de 30 novos integrantes e formamos um "grupão", o que inviabilizava os trabalhos e a dinâmica de um grupo de base. Formamos então o segundo grupo, que ficou conhecido como grupo Águia.

De coordenador de 2 grupos de adolescentes, fui convidado a coordenar a PJ da minha comunidade que contava com 3 grupos de adolescentes e 3 grupos de jovens. Era o ano de 1999. No mesmo ano, assumi provisoriamente a coordenação da PJ Paroquial de Piraju e representava a Paróquia nas Coordenação Diocesana de Ourinhos (SP). Sendo a Diocese de Ourinhos ainda nova, e Piraju nomeada como uma das cidades "região", fiz o trabalho de conectar com as outras cidades que faziam parte da região Piraju. Através de cartas, telefonemas e visitas de carro (com dinheiro do próprio bolso), conseguimos contatar os representantes de cada cidade. 

Na Coordenação Diocesana fiquei como representante da Diocese para as assembleias do Sub-regional. Infelizmente não pude dar continuidade nessa caminhada, não da forma como gostaria. Com minha mudança para a capital paulista no ano de 2000, por conta de uma oportunidade profissional, precisei interromper esse projeto.

Em São Paulo, consegui contato com o querido amigo Pe. Raymundo Aristides, e participei de alguns encontros da Escola Bíblica que ele liderava na época. Foi uma experiência maravilhosa. 

Hoje, sou pai de dois meninos, Felipe e Joaquim, que são a minha razão de viver. Moro em Uberlândia (MG) desde 2009. Já participei do grupo de canto da comunidade Imaculada Conceição e até iniciei o projeto de um grupo de jovens no formato da PJ. Fiquei como coordenador durante 6 meses e depois passei a coordenação. Formado em Administração (1998), Teologia (2018) e atualmente cursando o 5º período de Psicologia, sinto cada vez mais que a educação, o estudo em si, é um dos meios mais potentes para contribuir para si e para o mundo no sentido de construir pontes, quebrar paradigmas, e libertar para a vida plena que cada ser humano tem direito e merece. Afinal, "estamos nesse mundo uns pelos outros", esse é o verdadeiro sentido dessa nossa travessia. E a PJ, até hoje reverbera aqui dentro questionamentos que me fazem parar, refletir e agir, com senso crítico, justiça e amor. 

PJ não foi um mero caminho. Muito menos ficou perdida no passado. Ela é, continua sendo, caminho, caminhada e travessia. Eternamente travessia.