sábado, 10 de junho de 2023

Carta aberta: orgulho x hipocrisia



O assunto é delicado e pode levar a inúmeras interpretações equivocadas. Por isso é sempre necessário invocar o bom senso, ter empatia, saber acolher e se posicionar em prol da dignidade humana. Para início de conversa trago a seguinte questão: Quantos tipos de orgulho existem, ou melhor, como podemos interpretar a palavra "orgulho"? Particularmente, penso de duas formas: existe o orgulho, em seu significado negativo, que impede o ser humano de se redimir de algum ato cometido, o qual o resultado tenha sido prejudicial a si, a outros ou a uma situação; e, existe o orgulho, em seu aspecto positivo, aquele que nos enche de prazer e, que se dá no momento em que elogiamos alguém, "você me enche de orgulho". Como pai, não me canso de repetir aos meus filhos, o quanto eles me enchem de orgulho. 

Estamos nos aproximando de uma data em que já é um marco nacional e mundial: a PARADA DO ORGULHO LGBTQIA+. E esse termo é repleto de significado positivo, porém, incomoda os padrões de uma certa ala da sociedade. A PARADA não é apenas um ato de representatividade, é um momento de juntar forças e poder expressar, entre protagonistas, simpatizantes e apoiadores, o ORGULHO por ter tido a coragem de assumir perante ao mundo, aquelx que realmente é: simplesmente VOCÊ! Não é um movimento provocativo, nem impositivo mas um ato simbólico e de protagonismo que se expande para além do momento. Ao mesmo tempo há uma provocação sim mas, para que, enquanto telespectadores, saiamos do nosso anonimato e lutemos por igualdade para todxs, bem como a única imposição que existe é a de si mesmo, ao se aceitar como é de fato, sem precisar se encaixar nos padrões impostos. 

No tempo que antecede esse encontro, mercadores da fé usam de seu púlpito pseudorreligioso, ora transformado em palco de exibicionismo, ora em palanque de moralismo seletivo e, ora ainda, em tribuna religiosa para sentenciar àqueles que não se encaixam nos padrões sociais ditados por sua instituição. Segundo essa corrente seletiva de fé deturpada, tais desviados dos padrões são sempre merecedores de um certo inferno. E inferno sempre foi usado para usurpar e manter os fiéis submissos e alienados. De forma teológica, que meu ínfimo conhecimento acadêmico nessa área me permite, gosto sempre de lembrar e ressaltar quem foram os escolhidos citados nas passagens da bíblia cristã, o qual tinha como protagonista o nazareno, este que foi condenado por instituições religiosas, tido como blasfemador; literalmente um preso político de seu tempo. Ele dava voz e vez aos excluídos da sociedade: prostitutas, ladrões, cobradores de impostos, etc. E na contramão das regras sociais condenava a hipocrisia exacerbada dos mestres da lei e donos dos templos. Vale ressaltar que as instituições religiosas daquela época tinham poder igual ou maior ao do Estado. 

Nesse mesmo tempo em que uma instituição, que prega fé cristã, através de seu líder que usa das mídias, inclusive de seu canal de TV para segregar, dizendo que Deus odeia o orgulho, referindo-se ao ORGULHO LGBTQIA+, isso literalmente é tido como uma incitação nada velada de ódio e que pode acarretar formas violentas de expressão contra os protagonistas desse movimento, a PARADA. Na mesma semana em que esse líder religioso se manifesta, o pastor de uma de suas filiais foi preso, suspeito de estuprar adolescentes.  Talvez, se o dono desse templo institucional se preocupasse menos com a sexualidade alheia e tomasse conta dos gestores de suas filiais, dito religiosas, crimes assim não aconteceriam. Isso vale para toda pessoa e para todo tipo de instituição que se acha detentora exclusiva da verdade e no direito de classificar quem é ou não digno de sua aprovação arcaica. Veio à tona também, nas redes sociais que, sua instituição foi uma das que mais lucrou no Governo passado. Nesse caso, o silêncio tornou-se ensurdecedor. Os tempos mudaram mas os excluídos ainda existem e resistem contra o sistema discriminatório. Infelizmente os hipócritas também estão por aí e à solto. 

Nascido em berço Católico, conheço a fundo as diversas ideologias religiosas existentes nos bastidores da igreja. Devida à sua extensão, existem inúmeros braços e formas de se trabalhar mas, infelizmente , também está regada de moralismo seletivo, hipocrisia, deturpadores da fé e bandidos disfarçados de cidadão de bem. Minha formação e atuação sempre se deu através da Pastoral da Juventude, que tem uma representatividade muito forte nas questões sociais, políticas e lutas de inclusão. Sempre me mantive alheio aos exibicionismos de fé e shows milagreiros e midiáticos. A maior forma de se viver uma espiritualidade e praticar a fé é respeitando o outro, o próximo. O que não se pode tolerar são as formas de segregação que culminam em discriminação e preconceito. Falo aqui da vertente cristã (católica, evangélica, protestante, pentecostal, neo-pentecostal, etc...) porque é a que tem mais adeptos. Demais religiosidades, como budismo, espírita e as de matrizes africanas têm uma prática mais inclusiva e social.

Penso que, se a religião não te liberta e te faz perseguir e atacar minorias, tome cuidado. Você está sendo enganado, usado e manipulado. O intuito é te manter cego, surdo e mudo, enquanto você sustenta os vícios e regalias dos magnatas da fé.

Como pai de dois filhos, já trouxe em outros momentos que tenho um filho assumidamente dono de si: liberto de amarras, livre de mordaças. Considero um ser de muita luz, inteligência e amor, ao qual me ORGULHO dia e noite. Por ele, por eles, estou contra qualquer tipo de sistema opressor, seja religioso, seja político, seja de algum hipócrita sem noção que se punha no caminho. Para além de política e principalmente de qualquer crença religiosa, nossa missão é sempre combater a favor da inclusão, da igualdade, da justiça. Uma palavra resumiria tudo: amor. Amor cuidado, amor empatia, amor ao que se faz. Para além das instituições que regem a sociedade, nós, acadêmicos, que escolhemos o curso de psicologia como um meio para o futuro profissional, que tem como uma de suas missões, auxiliar o ser humano a encontrar respostas e ressignificar sua vida, precisamos nos ater e nos posicionar de forma sensata, humana e científica. 

A PARADA DO ORGULHO LGBTQIA+ está chegando, e de coração, estou me preparando para ir pela primeira vez, assistir de perto. Isso não partiu do meu filho, ao contrário, eu o convidei. E é pelo AMOR e por esse ORGULHO que tenho por ele, e pelas tantas lutas que pude presenciar e participar ao lado de amigxs tão queridxs dessa jornada, amigxs da Pastoral da Juventude, amigxs da teologia, amigxs do vôlei, amigxs das academias, familiares, afilhadxs, amigxs-irmãos de alma, amigxs da poesia, amigxs da psicologia, enfim, amigxs que a vida e o universo divinamente me presentearam, que não poderia me calar diante de tanta discriminação, preconceito disparados com ódio através daqueles que se julgam detentores da verdade. Pobres de espírito e podres no pensamento. Hipócritas. 

Essa luta não pode se findar nas palavras. PARADA DO ORGULHO LGBTQIA+ aí vamos nós!!! 


Ailton Domingues de Oliveira
Adm ∞ 
Teo ΑΩ 
Psic Ψ (acadêmico)
Escritor & Poeta
*Pós Graduando em Psicanálise, Coaching e Docência do Ensino Superior